quinta-feira, 26 de abril de 2018

REPUGNÂNCIA
26/04/2017
(Chegando de Atafona)
Voltar à casa e sentir-se desconfortável. Estranhamento diante do que sempre foi berço. Remexer-se dentre de si mesma para ver se a alma se ajeita no interior do corpo e não encontrar o emparelhamento do invólucro com as entranhas. Esquisitice no sentir e no reencontro com o que sempre foi familiar e escolha.
Tudo no lugar e tudo em desacerto. A beleza e o que sempre quis está aqui. O que antes vim escolhendo pela vida afora e colocando em cada canto – tudo em ordem: do galinho colorido que veio da terra portuguesa à minha foto com Luna na cabeceira. Tudo tão o mesmo quanto pouco íntimo e receptivo.
Que sensação será esta?
Verdade: desta vez não teve mergulho nas “minhas” águas douradas, aquelas que me reabastecem para a volta ao ambiente de seguir em frente. Na calha da minha parca vontade diante da mãe natureza, em Atafona os dias foram de alguma ou muita chuva e de mais acolhida familiar-afetiva em torno de intermináveis trocas do que de sol e conversas à beira mar e mergulhos. O corpo não vagou por entre as ondas de águas tíbias, como soe acontecer anos a fio, na minha medicalização particular de resistência às agruras da vida.
Volto. Cá estou. Meu quarto, meu espaço mais íntimo, meu delicioso ninho me acolhem. A tarde é sonolenta e de readaptação à rotina e a seus cheiros, cores e plasticidade. Me ajeito, me banho, me situo. Mas...
Sei não, mas toda a construção de uma vida inteira que me rodeia em minha deliciosa casa de viver e toda a restauração que sempre veio da praia da infância em seus véus de proteção estão fora de prumo. Onde a esperança? Quando a possibilidade? De onde o movimento de construção do novo? Por que o desconforto?
Tempo de pensar. Intervalo na escrita. Busca. Reflexão.
Uma hipótese (a que me vem e me domina): só eu sei o que significou a desorientação de que fui acometida, em meio à pureza da fé daquelas pessoas simples com quem reencontro a cada ano na Festa da Penha, na interação com a santa de sua fé. É, talvez seja isto: como me fez o peito apertar de mágoa, em plena missa campal, em que meu olhar e meu coração se abastecem não propriamente da religião ali professada, mas das vivas imagens de crença e piedade do arrebatamento dos fieis, ouvir ser anunciada ao microfone a presença de um profissional da política sem nenhum vínculo com aquela terra e aquele trecho de mar tão especial e sofrido onde o Paraíba do Sul despeja o que lhe resta de vida. Um estranho no ninho plantando alguma sórdida semente em busca de alguns votinhos por lá quando se fizer a hora?
Ah, Atafona..., foi realmente lamentável. Mas, felizmente, por mais que essa seja a fétida mistura que muitos e muitos estejam espalhando diante de nossos narizes, há um outro movimento que já consegue vislumbrar as intenções desprezíveis escondidas por trás dessas fisionomias que de cristãs não têm nem a sombra projetada no chão cru das areias por onde pisam.
Dê meia volta e pegue a estrada de volta, meu senhor! O "negócio" aqui é outro e dele sua alma pragmática não parece entender. Sinceramente, creio que não lhe diz respeito.

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