Escrito originalmente em setembro de 2010
Seis e dez da tarde. Na sempre bem feita novela das seis, finalmente o príncipe encantado beija a mocinha. Que emoção! Da minha poltroninha já meio socada por aguentar o peso a cada dia, na sequência de novelas que vai das 6 até mais de 10 da noite, de repente, o ímpeto de correr até o telefone e compartilhar o sentimento feminino que sei ser tão nosso diante daquele momento mágico. Eu teria que ser rápida para aproveitar o intervalo para ligar para as amigas noveleiras para dar uma sacaneada. Ligar pra quem? O povo da UFF está dando aula. Não é o caso. Huuum, mas tem Sil, Neuza, Ine: “Acordem, meninas! Humberto Martins – e rico! – é só na telinha”! Tento uma, duas, só a terceira atende, e de má vontade, com voz fingida, tentando se desvencilhar do intruso que estava querendo trazê-la de volta à realidade. Só quando eu me anuncio e digo a minha intenção, explode num riso gargalhado, de quem foi pega no maior flagrante: “...Só você mesmo para ligar numa hora destas...”
O caso é que já estou quase espírita de tanto que gosto da Escrito nas Estrelas. É como diz Tia Alice: espiritismo é como Brizola. Não dá pra gente se aproximar muito, se não acredita e se apaixona...
No fundo do meu coração, uma dúvida cruel me assola: quem terá sido o meu príncipe que nesta vida de agora, este feijãozinho com arroz que eu de fato conheço, até hoje não se apresentou, muito menos com um barco daqueles, com uma jardim daqueles, com uma criadagem daquelas, chefiada pela super eficiente, bonita e boa gente Antônia, ajudada por uma Berenice que chama a nova patroa de colega sem que isso traga problemas para a relação entre ambas, e tudo isso sem que todo aquele luxo signifique a exploração dos oprimidos e a existência de uma patrão cretino, vivendo à base da mais valia dos seus empregados... Sem falar do principal, do essencial, do fundamental: o responsável por tudo (não o chamarei aqui de patrão para não macular meu devaneio) é Humberto Martins, com sua boca, suas mãos, seus pés, sua cintura, seu pescoço e tudo mais que posso imaginar sobre ele. Bom, e o meu amor de verdade, onde andará a figuraça? Onde terá sido a minha Toledo? Campos, Campos, cidade da cana, em cada casa uma puta, em casa esquina um sacana é que não foi... Deus meu: cadê o amor que, de tão forte, atravessa existências? Sim, porque quem abalou meu coração nesta minha vidinha pobre de grande amores não veio de longe, muito menos pediu às forças do bem das outras dimensões para retornar para me encontrar. Que nada! Longe disto! Quem veio se achegando sob a alcunha de namorado, amante, marido ou coisa que o valha, me fazendo confundir junção de necessidades com amor verdadeiro foi gente desta vida mesma. Ninguém com pinta de que “Carmen é a minha Valentina”. Só rindo!
Mais tarde, já 8 e pouco da noite, ligo para as amigas que não me atenderam, e o que suspeitava de fato aconteceu: na hora do romance, às 6 da tarde, ninguém quis ver interrompido seu sonho, por isso foi menos traumático deixar o telefone tocar e não atender. Pode?
Realmente, é mais simples a gente continuar a discutir, em novos telefonemas, se vale mais a pena votar no Eduzão ou no Gabeira, na Marina ou no Plínio (adiantará querer informar ao novo governo que queremos um governo à esquerda e deixar Dilma para o segundo turno? Parece que a danada já ganha no primeiro). Mas, também, bem feito: ela também ficará enroscada na política sem passear de barco. Pelo menos nos próximos 4 anos... Se bem que com Zé Dirceu até dá para dar uma voltinha pelo Lago Paranoá, não dá, não? Hi, acho que esta minha última opinião foi politicamente incorreta. Deve ser ainda efeito do choque de ordem em meus afetos que a novela acaba de provocar.
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