terça-feira, 29 de março de 2011

Entrevista com Carmen Lozza

Se o aluno não entende a influência da mídia, está desconhecendo a si próprio

                                                                                         Por Katarine Flor do NPC (*)

O curso de Jornalismo de Políticas Públicas Sociais da UFRJ, coordenado pelo professor Evandro Ouriques, recebeu no dia 27 de abril (**) a professora aposentada da UFF Carmen Lozza, (...). Ela ressaltou a importância de se levar o jornal para as escolas, e incentivar a leitura crítica da mídia. "É um recurso didático, que precisa ser conhecido, lido e interpretado". Para ela, é necessário buscar a reflexão crítica dos alunos sobre a influência da mídia nos indivíduos, para que eles saibam fazer escolhas. E enfatizou o compromisso social da escola nesse processo.

Leia a entrevista feita com Carmen Lozza.

BoletimNPC - A senhora falou sobre a influência da mídia nas escolhas individuais e que é importante trabalhar uma visão crítica com os alunos. Por que isso é tão importante?

Carmen Lozza - Se o aluno começa a perceber que ele não é o dono total de sua vida, e que sofre uma influência enorme da mídia, ele vai se conhecer melhor. Vai entender seus limites e suas possibilidades para intervir. Não adianta formar um aluno que acha que é o "bam bam bam", e que pode tudo. Ele vai ter uma avaliação de conjuntura completamente equivocada, porque ele não pode tudo não. Também não é positivo um aluno que acha que tudo é determinado, e que não pode nada. Este aí então vai ficar alienado.

Por isso é fundamental contribuir para que ele faça essa análise crítica. Quando ele começa a entender a influência que sofre da mídia, ele vai se assenhorando dele próprio, das suas próprias capacidades e das suas condições de intervenção.

A expectativa que eu tenho é que ele possa fazer escolhas melhores. Não só em relação à leitura, mas tudo em sua vida. E que ele possa escolher em quem vai votar, o que pode fazer no grêmio dele, qual a proposta mais adequada. Ele vai ficar mais lúcido em relação aos seus limites e possibilidades. Se ele não entende a influência da mídia, ele desconhece a si próprio.

BoletimNPC - Ao trabalhar essa questão nas escolas, como a senhora percebeu essa mudança?

Percebo alterações quando eles começam a ter atitudes na própria escola, e tentam mudar alguma coisa. Quando o aluno, por exemplo, lê no jornal sobre uma vala que está fétida do lado da escola, e ele vai se informar sobre aquilo. Que vala é aquela? Por que está assim? Aí ele descobre que não é um valão, mas sim um rio que está completamente poluído. E vai tentar buscar uma solução para aquilo. Vai falar com os colegas, com os professores, e tentar se juntar para fazer alguma coisa para mudar.

BoletimNPC - A senhora acredita que os professores já estão muito conformados e desestimulados, e que, por isso, não buscam esta leitura crítica utilizando os
jornais?

Tem tido muito desânimo, sim. Claro que existem aqueles que não desistem, mas o professor está muito empobrecido. Muito entristecido. É isso que eu tenho visto na maioria das vezes.

Ou então, quando a escola é particular, ele está sem espaço, sem opção. Tem que trabalhar em instituições onde não tem poder nenhum. Então ele tem que seguir aquela "cartilha". Oferece um ensino apostilado, onde tem que passar o conteúdo daquele dia. Não tem espaço nenhum para trabalhar jornal, nem nada diferente daquilo que está naquela apostila.

BoletimNPC - Durante o curso, a senhora falou sobre o pensamento crítico, mas que ele vai além de estimular a opinião. Como é isso?

A opinião não tem compromisso com a verdade, com a ciência. Eu posso ter a opinião mais diversa sobre vários assuntos. Agora, se eu me disponho a tentar entender uma determinada questão, não é mais uma opinião que fique na mera vontade de cada um. Eu tenho que buscar indícios mais científicos, fazer relações, localizar melhor aquilo, estudar muito. Eu não posso fazer uma crítica sem ter uma base teórica que possa me dar uma fundamentação para entender melhor aquele assunto. A opinião é uma questão até de gosto. Pensamento crítico é outra coisa.


(*) Originalmente publicada no Boletim do NPC.
(**) de 2009.

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