A ideia que subjaz ao conceito de choque de ordem que está sendo proposta para corrigir as mazelas da Educação no Rio de Janeiro, ao que me parece, traz em si uma visão que contraria as melhores possibilidades de ser oferecida a educação pública, democrática, de qualidade socialmente referenciada, laica e universal que é devida à população de nosso Estado.
Só o fato de serem agrupadas, sob este rótulo, as medidas a serem levadas a efeito para o setor educacional, já sugere que são concebidas com um caráter impactante, imediato, rápido, conflituoso, metódico, disciplinar, preceitual,…, que tragam “pronto restabelecimento” para o doente em estado tão grave, no caso, a educação escolar oferecida pela rede oficial estadual.
Depois do que vimos pela TV quando da tomada do Alemão, numa alegoria tresloucada, posso imaginar que talvez fosse assim o novo Choque: coloque-se o “salvador” Bope Educativo (inspetores, julgadores, avaliadores, controladores…) para invadir as escolas, à mostra, posturas de quem tem certezas já sabidas e culpados já encontrados a priori; e de lá sairão correndo, fugidos, os responsáveis pelo fracasso da ação educativa, os maus profissionais da educação. Porta afora, sairão ofegantes, atravessando a estrada mais próxima, a caminho de casa, entristecidos uns, revoltados outros, incrédulos outros tantos…
Nem o caminho do sindicato será buscado, pois, diferentemente de outros tempos, parece que não tem havido uma relação mais estreita entre os profissionais e suas entidades. E os responsáveis pelo choque da ordem poderão fincar, bem no hall de entrada, a bandeira de sua produção documental (novas portarias, propostas curriculares, exigências, editais,…), anunciarão a boa nova, que é chegado um novo tempo, de paz, de produtividade, de estímulo às melhores competências exigidas dos alunos pelo mercado, tempos de separar o joio do trigo, tempo de prêmios, de uma nova ordem, enfim.
Do meu ponto de vista, a Educação não necessita nem de choque nem de ordem, que dirá de choque de ordem! A Educação não pode ser vista como um bom negócio que se faz rapidamente, diante da sagacidade de quem tem habilidade para fazer crescer lucros e oportunidades. A Educação não precisa (muito pelo contrário!) de que seja estimulada a competição entre os profissionais da educação, como tem sido comum nos últimos tempos.
Mesmo estando em tempos de mais cuidar de meu jardim que de dar aulas, não posso deixar de pedir um favor à equipe da secretaria de educação do Estado: escutem a presidente. Assim, quem sabe, as coisas comecem a caminhar numa outra e boa direção. Sim, refiro-me ao discurso de Dilma (em quem nem votei no primeiro turno; estive com Marcelo Freixo e com quem estava com ele) no momento de sua posse no Congresso Nacional, quando afirmou que:
“só existirá ensino de qualidade se o professor e a professora forem tratados como as verdadeiras autoridades da educação, com formação continuada, remuneração adequada e sólido compromisso com a educação das crianças e jovens.”
Imagino que essa, mais do que simplesmente uma ação, é uma premissa para o sucesso de qualquer política que transforme, verdadeiramente, a Educação: uma nova compreensão acerca do quanto o professor é a legítima autoridade capaz de fazer mudanças que perdurem e que, de fato, transformem, na essência, aquilo que precisa ser mudado. Políticas vindas de fora para dentro, políticas que neguem o professor, políticas que tentem secundarizá-lo, são inúteis. Dão no que aí está. E mudar para permanecer, não é o caso (Ou é?).
Imagino que reforçando o cotidiano da escola, deixando valer o poder dos profissionais em se influenciarem mutuamente, estabelecendo-se o trabalho coletivo na escola, com um sentido real para todos poderem repensar suas práticas, num processo de formação continuada em serviço, revendo-as em conjunto, é um começo.
O professor, com autoridade, terá poder de exercer influência, juntando o agir e o pensar num só sujeito, sem que uns valham mais que outros. E sem que haja necessidade de fuga. Que, aliás, pelo que pude saber, já tem havido muita, com grande número de desistências de mestres abandonando a carreira.
(*) Artigo publicado originalmente no sítio da Caros Amigos em 26.01.2011
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