Escrito originalmente em 2011
Uma vez que fui a uma reunião em uma escola na Barra da Tijuca, pertencente a uma destas redes de ensino privadas que têm mil filiais espalhadas pela cidade, pelo estado, até mesmo pelo país, as chamadas escolas apostiladas. Pois, vocês não vão acreditar: atende-me uma coordenadora, uniformizada, com cara de gerente de banco ou aeromoça, toda de azul marinho, na blusa o emblema da escola no peito, bem na direção do coração. A imagem já era tão pasteurizada que me causou arrepios. Mas, tentei não criar preconceitos, afinal de contas, marxista de carteirinha, não queria me deixar levar pela aparência, estas coisas de quem tenta buscar a tal da unidade entre aparência e essência. Era ir adiante e não me deixar levar pelo impulso de fugir dali, às pressas...
Pois não tive êxito. Conversa vai, conversa vem, enquanto caminhávamos em direção ao auditório onde me aguardavam os professores com quem eu conversaria sobre Mídia e Educação, o que vocês imaginam que a moça possa me ter dito, com galhardia, certa de que sua afirmativa guardava grande sabedoria e que era adequada para aquele momento de jogar conversa fora tão comum para a circunstância? Juro que teria sido melhor se tivéssemos ficado naquele feijão-com-arroz de o-dia-está-quente,-ontem-esteve- mais-frio,-a-chuvinha-veio-em-boa-hora, ou coisa que o valha...
A pérola foi a seguinte:
- Sabe, professora, nossa meta este ano é alcançar a qualidade de ensino, custe o que custar. Temos feito reuniões e mais reuniões com os professores de todas as unidades para debater a nossa intenção. O exemplo que tenho dado para eles e que acho pertinente é que a nossa rede tem que se espelhar no Mc Donald’s. Quando vamos a um Mac Donald’s a batata frita não tem a mesma qualidade, esteja a filial onde estiver? Pois é isto que queremos: que o nosso ensino seja como a batata frita do Mac Donald’s, sempre igual, Afinal, todos têm que receber o mesmo conteúdo, não é?
O bom é que Deus existe e me protegeu naquela hora – para que eu não tivesse tempo para responder nada, com o risco de criar um clima desagradável com a minha anfitriã, eu que já via fugir garganta agora, já pulando na gola da blusa, algumas palavras que iriam tentar fazer conjecturas sobre algumas possíveis diferenças entre batatas fritas e gente. Eis que uma porta se abriu e era o auditório à nossa frente, muitos olhares em minha direção, hora de cumprimentar os colegas e começar a falar. A conversa, com a cumplicidade de Deus terminava ali.
Mas, para que eu pudesse dormir tranquila, na noite que viria em seguida – e nas seguintes, por suposto -, arranjei um jeito de, naquela fração de segundos que me separava da moça-que-vê-gente-como-batata frita do auditório cheio, com quem eu esperava dialogar com o coração quente de vontade de tratar das mazelas e perspectivas da escola, pois eu tive tempo de incluir em meu discurso um trecho que tratava justamente de como a mídia nos massifica, tentando fazer de nós uma maçaroca, todo mundo meio de um tom só, de um gosto só, de uma escolha só, quase como as batas fritas do Mac Donald’s, iguaiszinhas onde quer que estejamos...
Nada disso, aqui resistimos, aqui refletimos, aqui insistimos em termos direito à diferença, ao pensamento crítico. Aqui podemos olhar e tentar ver mais além, com todo o direito de gostarmos de bife mal ou bem passado, “ao ponto”, se for esta a preferência, para acompanhar batatas, quaisquer que sejam elas, fritas, assadas, chips, gratinada, à portuguesa, Rösti, até as da caixinha vermelha do Mc Donald’s, todas deliciosas. No meu ponto de vista, Há outros...
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