AMANHECERES
25/11/2016
Aos quinze anos, perdi o primeiro de meus irmãos. Morte trágica, num acidente. Coisa totalmente inadequada, improvável, inesperada, inimaginável... para uma menina que apenas pensava no primeiro - e grande - amor e no modelo do vestido da festa do próximo sábado. Está aqui cravado feito tatuagem: do primeiro luto, a gente nunca esquece.
Aqueles foram tempos em que, me lembro bem, quanto mais cedo o sono chegasse e mais tarde ele se despedisse tanto melhor. Era um verdadeiro alívio as horas em que o corpo se entregava a Morfeu. Podia sonhar com o que fosse, mesmo o mais horripilante pesadelo, tudo era melhor do que estar acordada e lidar com aquela perda que, em plena adolescência, eu sentia como brutal e totalmente incompreensível.
A cada amanhecer, a hora em que abria os olhos e voltava a perceber o que ia em torno e o porquê de o corpo estar tão castigado, vendo chegar à consciência o luto que me/nos dominava implacavelmente, é que era o ponto nevrálgico – e inescapável - na sequência dos dias.
Guardadas as devidas proporções e a tipicidade das dores, hoje em dia, acordar para mim também está guardando uma conotação de martírio inconteste. Deparar-me, a cada manhã, com a penúria moral, política, econômica, humana que nos circunda é aterrorizador. Se já não houvessem roubado o abismo, como alguém já falou, seria hora de sairmos correndo, mesmo sem saber pra onde, pois para lá nos empurram – com vigor e total senso de impunidade e cinismo.
E nós, vamos nos deixar levar?
Das duas, uma: ou é luto ou é luta.
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