segunda-feira, 16 de maio de 2011

"FIDIQUEM"?






Carmen e de quem era filha, João Pessanha
Esta era a pergunta mortal. Não há quem, nascido em Campos, lá pelos meados do século passado (Será assim ainda hoje?), não se lembre dela. Era só haver um novo amigo ou namorado a ser apresentado à família, que o indefectível fidiquem vinha certeiro, como incontestável instrumento separador de joios e trigos. Sim, porque se não se soubesse de quem era filho o candidato a entrar naquele novo terreno, toda a gama de preconceitos e temores era posta em ação contra o intruso que se pretendia digno de entrar naquela “nova morada”. Fosse filho de alguém conhecido, ótimo!, estava dada a senha para que a aceitação viesse pronta, assim como um simbólico cartão magnético capaz de abrir qualquer agência da instituição bancária da qual é correntista (Não deve ser à toa que o exemplo que me surge tem a ver com finanças...). Mas se o coitado não fosse filho de alguém conhecido, aí só o tempo diria se teria como adquirir o passaporte seguro para sua pretensão de ter direito a se chegar ao mundo dos que sabiam de antemão o poder de quem eram filhos. Na verdade, mais do que uma simples expressão típica do linguajar local, o fidiquem indicava um jeito extremamente conservador e segregacionista, indicado para manter “cada qual em seu lugar”, reduzindo as chances de uma interessante e democrática diversidade.

Lembranças da infância

O BAILADO DAS BALAS

Na esquina lá de casa com a Rua da Baronesa tinha uma venda onde eram vendidas balas de goiaba, umas balas duras como nenhuma outra e tão deliciosas a ponto de provocar esta viva rememoração. Sua cor era de goiaba mesmo, eram meio brilhosas, quadradinhas, esquisitas, diriam os argentinos...

Mas neste texto que brota sei lá de que rincão de minha história, a bala de goiaba entra mesmo só para anunciar o que virá, tal qual uma hipotética participação dos nossos Paralamas abrindo um show dos Rolling Stones, antes dos ingleses cantaram, para delírio geral, a sua histórica Satisfaction



Pois os Rolling Stones a que quero me referir aqui são o bailado que as habilidosas mãos do balconista da venda da esquina faziam para embrulhar as balas compradas pelas crianças da vizinhança.

O papel era acinzentado, rústico, meio manchado, até lembrando os reciclados de hoje em dia, e era puxado de um tipo de bobina serrilhada, grandona, postada atrás do balcão, de onde o artista puxava e cortava o pedaço que queria, maior ou menor, de acordo com a quantidade de balas a embrulhar.

Postas as balas no centro do papel[i], dava-se início ao bailado. Com ambas as mãos, como se fosse uma daquelas donas de casa argentinas processando suas rechonchudas empanadas, ele vinha dobrando as abas do papel, uma após outra, como uma empanada mesmo, até chegar ao último ato: era quando o moço, artista anônimo de minha esquina, de quem não me lembro a face, apenas o gesto, lançava o pequeno embrulho em volta dele mesmo, numa volta inteira pelo ar, firmando-o pelas últimas dobras já feitas, uma em cada mão. O resultado era um perfeito pacotinho de balas, com os dois “chifrinhos” enroscados, milagrosamente surgidos como seu derradeiro fecho. Era coisa de Terceiro Ato mesmo. Só que, para mim, ali o cisne sempre revivia, como se contássemos, como fundo musical, com o som da mais cristalina execução do eterno Tchaikovsky. Pura expressão de uma Arte singela, hoje viva apenas em minha memória.

A paixão que passei a ter pelo que são capazes de fazer as mãos humanas, com certeza, surge em grande medida daquele gesto – para o moço, tão corriqueiro –, e faz dele uma de suas mais nobres inspirações.





[i] Comentário de Rosinha – “E não eram só balas, também açúcar, farinha... eram embrulhados assim. Eu me lembro de abrir o pacote do açúcar e da farinha e ir misturando uma e outra, na própria mão, saboreando a mistura até chegar lá em casa.”

sábado, 9 de abril de 2011

E agora?


Escrito em 9 de abril de 2011.


                                                                                                                      
                                                                              “Enquanto não conseguirmos suprimir qualquer das
causas do desespero humano, não teremos o direito 
                                                                                    de tentar a supressão dos meios pelos quais o
 
homem tenta se livrar do desespero.” 

                                                                                    (Antonin Artaud, citado por Arthur Dapieve, 
                                                                               em 18/11/05, no Segundo Caderno, O GLOBO)


De nada adianta me lembrar do meu aluno que, há décadas atrás, fui visitar na prisão, junto com minha amiga, também professora, quando soube que ele havia sido preso por tráfico de drogas. Tampouco me alivia a lembrança da família dele, com a qual fomos estar em seguida, num subúrbio de Niterói, dando apoio e tentando ver do que precisavam naquela hora tão surpreendente em suas vidas... Havíamos saído do Conselho de Classe da escola em que trabalhávamos e o diretor havia se pronunciado, solenemente, sobre o drama da escola (não do menino), com a descoberta de seu envolvimento com drogas. Mas, ao contrário de nós, estupefatas diante de circunstância tão inusitada, ele, o diretor, estava tranquilo, o flagrante não fora dentro da escola, assim sendo, a instituição estava liberada de culpa.  Céus! Até hoje me causa náusea, mas era isso mesmo: o temor do “cidadão” era diante de algum respingo vir a macular a imagem da escola e ele, indicado para o cargo pelo político da ocasião, vir a perder os seus caramimguás, exígua gratificação a que tinha direito a cada final de mês.  

Presunçosa, me senti “a” educadora, diante daquele sujeito egoísta e pouco sensível. Mas, hoje, ante a tragédia, me olho de frente e não adianta: também sou cúmplice pela desgraça deflagrada pelo jovem das manchetes destes dias ter se tornado um assassino e matado outras tantas vítimas, além dele próprio, sob a fúria de sua arma de fogo. Os gritos que dera antes (Onde os terá dado? Quem os terá ouvido?) para aliviar o próprio sofrimento de vítima, nós, educadores, não os ouvimos. Simbolicamente eu também estive surda e alheia aos horrores pelos quais passou esse menino. Pura obra do acaso não ter sido um aluno meu, de carne e osso, quem veio a aterrorizar a todos nós, pela fatídica inauguração de um crime tão bárbaro, até ontem totalmente distanciado de nossa alardeada “índole pacífica” de brasileiros. Quem garante que não poderia ter sido de verdade um de meus alunos? Quem me assegura que algum deles não padece, talvez não de um mal tão devastador, mas de dores que o faz menos humano do que poderia e pode ser?

Pois o império também isso nos tirou, globalizando a monstruosidade. E eu não vi que tal tragédia se anunciava, silenciosa e célere.

Perdão, alunos meus, que sofreram sem que eu os tivesse ouvido e entendido! Voltei-me para outras franjas do cotidiano e não vi o seu olhar, não atentei para sua angústia, não ouvi o seu pedido de socorro. Pensei em Filosofia, pensei em Educação, e não me voltei para você, diante de mim, com sua vida a lhe rasgar o peito, fazendo- o infeliz à beira de uma mórbida necessidade de vingança. Afinal de contas (tento aqui me defender), a me corroer o peito, eu também vivia minhas próprias dores...

Fora da escola, bem que lutei junto a meus pares por melhores condições de ensino e por melhores salários. Pretendi ter menos alunos em turma, como forma de garantir uma maior atenção a cada qual e uma menos árdua tarefa de educar. Demonstrei meu inconformismo quando, no início de cada ano, minhas turmas tinham em torno de 50 alunos e a coordenação da escola, diante da minha ”grita”, me pedia calma, alegando que vários deles iriam desistir e a turma passaria a ter um número mais razoável de integrantes, naturalizando, covardemente a evasão escolar.

Mas, e daí? Nem isso nem escudar-me nos desmandos dos governos que se sucedem, cada vez mais retardando a oportunidade de virmos a ter a educação pública, democrática, de legítima qualidade social, laica e universal que é devida à população de nosso país não me tira o gosto de fel da boca nem tampouco as lágrimas renitentes do olhar.

O fato, para mim, é que três dias de luta é o mínimo. O máximo vamos ter que descobrir juntos.


Ele está no meio de nós

Escrito na manhã da chegada do presidente Obama ao Brasil

Caros amigos, Obama está chegando. "Ele está no meio de nós", dá vontade de dizer, lembrando as antigas rezas e, com certeza, associando-as ao poder que este Ele divino tem sobre nós que já o conhecemos mais de perto e este outro Ele, visitante, que nem precisa se assomar, para sabermos a extensão do seu poder diante do mundo terreno. Apesar de toda a crise, acrescento. Dá até pra se ter dúvida sobre qual dos dois tem a mais poderosa espada simbólica sobre nossas cabeças para definir nossos destinos neste mundo. Pelo menos, postando lentes contemporâneas ...

Pois Obama está chegando. Tão simpático, até charmoso, eu diria, viciada em checar nos espécimes do sexo “forte” (o mesmo de Deus e de Obama) o nível de seu fascínio perante nós, mulheres. E ainda vem esbanjando sua negritude, o que coloca nossa porção politicamente correta a percebê-lo como elo vitorioso de uma minoria a quem o Brasil, construído à base de trabalho escravo africano, tanto deve historicamente. Tudo posto, pois, para que possamos dispor nossa melhor toalha rendada na janela para saudá-lo. Assim, ele chegará e conhecerá o nosso tão propalado espírito pacífico. Houvesse mais tempo para o povo saber de evento tão relevante, talvez sua vinda se transformasse num fenômeno similar ao da visita de Marta Rocha, quando foi à minha cidade, lá pelos idos da década de 50 do século passado, provocando o maior reboliço com as gentes todas aclamando sua beleza invulgar desde o aeroporto até as ruas centrais da então ainda pequena Campos.

Pois o assunto é sério e merece um olhar menos dominado pelo que a mídia insiste em divulgar a respeito. Vejam o poema-discurso que o nosso Afonso Romano criou  e que eu acabo de descobrir esta manhã, lembrada por meu amigo Ezequiel Teodoro da Silva. Espero que cada qual se sinta representada por ele como eu.
Não deixem de assistir:


sexta-feira, 8 de abril de 2011

Nós, mulheres, e Ricardo Aguillar

Escrito originalmente em setembro de 2010

Seis e dez da tarde. Na sempre bem feita novela das seis, finalmente o príncipe encantado beija a mocinha. Que emoção! Da minha poltroninha já meio socada por aguentar o peso a cada dia, na sequência de novelas que vai das 6 até mais de 10 da noite, de repente, o ímpeto de correr até o telefone e compartilhar o sentimento feminino que sei ser tão nosso diante daquele momento mágico. Eu teria que ser rápida para aproveitar o intervalo para ligar para as amigas noveleiras para dar uma sacaneada. Ligar pra quem? O povo da UFF está dando aula. Não é o caso. Huuum, mas tem Sil, Neuza, Ine: “Acordem, meninas! Humberto Martins –  e rico! – é só na telinha”! Tento uma, duas, só a terceira  atende, e de má vontade, com voz fingida, tentando se desvencilhar do intruso que estava querendo trazê-la de volta à realidade. Só quando eu me anuncio e digo a minha intenção, explode num riso gargalhado, de quem foi pega no maior flagrante: “...Só você mesmo para ligar numa hora destas...”

O caso é que já estou quase espírita de tanto que gosto da Escrito nas Estrelas. É como diz Tia Alice: espiritismo é como Brizola. Não dá pra gente se aproximar muito, se não acredita e se apaixona...

No fundo do meu coração, uma dúvida cruel me assola: quem terá sido o meu príncipe que nesta vida de agora, este feijãozinho com arroz que eu de fato conheço, até hoje não se apresentou, muito menos com um barco daqueles, com uma jardim daqueles, com uma criadagem daquelas, chefiada pela super eficiente, bonita e boa gente Antônia, ajudada por uma Berenice que chama a nova patroa de colega sem que isso traga problemas para a relação entre ambas, e tudo isso sem que todo aquele luxo signifique a exploração dos oprimidos e a existência de uma patrão cretino, vivendo à base da mais valia dos seus empregados...  Sem falar do principal, do essencial, do fundamental: o responsável por tudo (não o chamarei aqui de patrão para não macular meu devaneio) é Humberto Martins, com sua boca, suas mãos, seus pés, sua cintura, seu pescoço e tudo mais que posso imaginar sobre ele. Bom, e o meu amor de verdade, onde andará a figuraça? Onde terá sido a minha Toledo? Campos, Campos, cidade da cana, em cada casa uma puta, em casa esquina um sacana é que não foi... Deus meu: cadê o amor que, de tão forte, atravessa existências? Sim, porque quem abalou meu coração nesta minha vidinha pobre de grande amores não veio de longe, muito menos pediu às forças do bem das outras dimensões para retornar para me encontrar. Que nada! Longe disto!  Quem veio se achegando sob a alcunha de namorado, amante, marido ou coisa que o valha, me fazendo confundir junção de necessidades com amor verdadeiro foi gente desta vida mesma. Ninguém com pinta de que “Carmen é a minha Valentina”. Só rindo!

Mais tarde, já 8 e pouco da noite, ligo para as amigas que não me atenderam, e o que suspeitava de fato aconteceu: na hora do romance, às 6 da tarde, ninguém quis ver interrompido seu sonho, por isso foi menos traumático deixar o telefone tocar e não atender. Pode?
Realmente, é mais simples a gente continuar a discutir, em novos telefonemas, se vale mais a pena votar no Eduzão ou no Gabeira, na Marina ou no Plínio (adiantará querer informar ao novo governo que queremos um governo à esquerda e deixar Dilma para o segundo turno? Parece que a danada já ganha no primeiro). Mas, também, bem feito: ela também ficará enroscada na política sem passear de barco. Pelo menos nos próximos 4 anos... Se bem que com Zé Dirceu até dá para dar uma voltinha pelo Lago Paranoá, não dá, não? Hi, acho que esta minha última opinião foi politicamente incorreta. Deve ser ainda efeito do choque de ordem em meus afetos que a novela acaba de provocar.


Na dúvida, me apresento...

Texto originalmente escrito em 2008

Sou uma professora, uma professora que foi se apaixonando cada vez mais por sua profissão à medida que descobria a sua paixão por, de alguma forma, contribuir para o mundo ser melhor. Vejo hoje, numa retrospectiva de minha vida, que foi assim mesmo: com o meu inconformismo diante da desigualdade social, desde o início do magistério, no sertão de S. João da Barra, ingenuamente, alfabetizando e cuidando de meninos e meninas pobres, até o passar dos anos, com a minha formação acadêmica (meu mestrado na UFF) e minha prática sindical (militava no SEPE, quando de sua fundação) fui casando o político com o pedagógico e cada vez mais me envolvi com a minha paixão profissional - estar com pessoas, em momentos de aula, para tentar abrir espaços para a humanização. Na verdade, sustentando meu corpo que vai envelhecendo (afinal de contas, sou uma mulher de 64 anos), há uma alma ainda de menina emocionada e alerta e não desistente (meu maior tesouro?). O amor pelo Outro já não depende de mim, o que a realidade dos despossuídos provoca em minha ação cotidiana já está fora de meu controle. E o Magistério no sentido mais amplo possível é o que apazigua meu coração...

As palavras sempre me seduziram e dedicar-me a estudar com os professores o discurso do jornal pareceu-me uma possibilidade de dar conta de minha paixão por dar voz àqueles que tradicionalmente não são ouvidos. Quando fui convidada para coordenar o programa QUEM LÊ JORNAL SABE MAIS, de O GLOBO, amparada numa perspectiva histórico-crítica de educação, estudei Bakhtin e me dediquei a compreender melhor a temática da análise de discurso. E pensei: se as empresas jornalísticas queriam formar leitores para garantir seus negócios, nós poderíamos formar leitores pelos próprios benefícios de se formar leitores, ou seja, pelo que a leitura, em si, pode trazer para cada leitor. Minha intenção junto à equipe com a qual trabalho, é de permitir que cada leitor reconheça no seu jeito de ser e viver a influência das leituras que faz, apropriando-se das raízes de sua individualidade. O que se espera é que cada leitor possa discutir os seus próprios limites e possibilidades frente aos elementos institucionais formadores de opinião que tanto o influenciam, dentre os quais se destaca, em grande medida, a Imprensa. O que se espera é que cada leitor possa aproveitar as possibilidades que a leitura traz para uma vida cidadã, indo além da simples absorção acrítica daquilo que lê, com destaque para as notícias. Marca-nos o inconformismo diante da desigualdade social e o prazer e compromisso com a realização de ações que possam conduzir, de algum modo, à justiça social. Em última instância, a expectativa que se tem é de contribuir efetivamente para a formação de seres éticos, capazes de efetuarem escolhas lúcidas nos diversos níveis de suas vidas, a partir do reencontro com a capacidade de serem autores de seus singulares modos de ler, interpretar, conhecer e interferir.

O leitor, o filme e a vida

Escrito originalmente em maio de 2009, após assistir ao filme O LEITOR

O papel cumprido pelo filme O LEITOR para evidenciar a importância de as pessoas saberem ler e escrever vale mais do que muitos discursos, ou aulas e explicações, dadas por quem quer que seja. O impulso que temos é de recomendar com grande entusiasmo que todos possam ir vê-lo com a maior brevidade possível. É pegar um agasalho leve no armário para não sentir frio no cinema (Quer coisa pior?) e procurar no jornal onde está sendo levado e rumar para lá.

Na verdade, para a população letrada fica até difícil imaginar o quanto o analfabetismo reduz a capacidade de viver dignamente para cada ser humano que se vê privado de ler em seu viver cotidiano. Sem decodificar e entender o sentido das palavras, como compreender – e enfrentar – o mundo, dia após dia, compreendendo o sentido das coisas? Desde o nome do ônibus que passa até a bula de um remédio, do bilhete mandado pela professora do filho até a orientação para fazer um simples bolo, sem saber ler, qualquer pessoa tem sua vida dificultada dos menores ao maiores detalhes.  Mas nisso, quem lê e vive habitualmente o conforto proporcionado por sua habilidade leitora, nem sempre pode pensar, envolvido com suas próprias circunstâncias de vida. O fato de não se viver a situação, afasta as pessoas de senti-la com maior realismo.

Mas, na sala de cinema, com a evolução da estória que se desenrola na tela, não só sob a forte emoção provocada pela beleza do argumento como diante do magnífico desempenho do casal de atores (no caso do protagonista, tanto jovem quanto já maduro), entre em nossa alma – e com doída crueza – em que pode se tornar um ser humano quando dele é subtraída a possibilidade de ler e escrever.

Nunca esperaríamos de nós mesmas que pudéssemos compreender o horror de um ser humano promover mortes em série, apenas por ignorância. Não se trata, longe de nós!, de justificar tal violência inominável. Insistimos: não se trata disso! Mas, sim, de dizer para quem puder nos ler, que pudemos sentir como a vida de uma pessoa pode ser destroçada por uma ausência tão significativa como a que lhe pode chegar pela palavra escrita. Isso não é tudo na integridade de seu ser, mas como é essencial!!!!

Quem viu o filme, me corrija ou me ensine melhor a vê-lo, por favor.


“Enquanto não conseguirmos suprimir qualquer das

 causas do desespero humano, não teremos o direito

 de tentar a supressão dos meios pelos quais o

 homem tenta se livrar do desespero.”


(Antonin Artaud, citado por Arthur Dapieve, em 18/11/05, no Segundo Caderno, O GLOBO)

Professor, o que temos a nos dizer hoje?

Escrito originalmente em 14 de outubro de 1998, em homenagem ao Dia do Professor(*)

Foi só o 15 de outubro vir se aproximando e veio vindo junto uma grande vontade de tentar rascunhar este artigo. Nem bem um artigo, talvez uma conversa, tendo, do lado de cá, uma  professora que, mesmo já afastada das salas de aula convencionais, continua vivendo o permanente ensinar-aprender que acontece no seu dia-a-dia, em suas andanças pelas escolas, debatendo com os professores as possibilidades e limites do jornal na escola. E do outro, todos aqueles que vem encontrando em cada canto, os mais inusitados e distantes, em reuniões e mais reuniões que sempre lhe ensinam o mais importante: que eles - os homenageados de hoje -  sempre estão lá, um ou mais deles - nunca nenhum -, irrecuperáveis em sua mania de tentar, de seguir em frente, de insistir em reinventar formas e meios de fazer de seus alunos cidadãos... Cidadãos que precisam conhecer o mundo e suas contradições e com quem lá vão eles a buscar a melhor forma de discutir os homens, as mulheres, as coisas, a vida, deste e de outros tempos, para que cada qual possa formar opinião, decidir, pensar e agir...

O engraçado - ou espantoso ... -   é que, contrariando a prática habitual, quando o desejo de escrever sobre algo vem sempre acompanhado das idéias que irão compor o futuro texto, desta vez a vontade de escrever não chegava acompanhada do "o que dizer"... Apenas ela, ali, meio escondida, a vontade solitária, vazia de temáticas, ociosa de coisas a dizer...

Amanhece o 14 de outubro, véspera do grande dia, e a sensação do "ou agora ou só ano que vem..." apressa tudo: é ir pra frente do computador e tentar. Mas, como, se o vazio continua?  Falar o já dito não satisfaz. Apenas ficar na já velha e gasta homenagem de dizer que somos isto e aquilo e coisa e tal, encher nossas almas de palavras bonitas, mas ocas de sentido para quem está lá, do outro lado, no emaranhado das escolas, sobrevivendo à custa de muito suor, cada vez espalhado em mais e diversificados lugares, tentando compor um salário menos aviltante? Não, repetir o velho não é o caso mesmo... Falar do presente... e o futuro? Dizer no abstrato ... e o concreto?

O que vai ficando cada vez mais claro é que só tenho mesmo a insistir no elogio aos que persistem; no abraço solidário aos que se emocionam; no incentivo aos que se comprometem com o desafio de ser educador; no agradecimento pelo aprendizado de que vale a pena acreditar que nossos meninos e meninas podem usufruir de um mundo melhor, mais de todos e de cada um    ...

Neste país ao qual o futuro já chegou, sem trazer a bonança tão anunciada, quem sabe nossa força não esteja mesmo na construção do presente, ao qual temos emprestado o melhor de nós para adiar cada vez mais a falta de perspectiva em relação ao que virá?

A nos dizer, mesmo, de verdade, hoje, creio que é isto: vamos prosseguir, buscando cada vez mais aqueles companheiros que, como nós, também queiram vencer o desafio de forjar novas utopias, insistente e solidariamente. Sozinhos não conseguiremos compreender e enfrentar os desafios desta agoridade tão esgotada em seus próprios dias, tão sem respostas para as nossas angústias, angústias que, não raras vezes, nos calam diante de nossos alunos, repletos de quereres e necessidades não satisfeitos, atônitos diante de um futuro que a eles se apresenta como sombrio e fechado?

Resta-nos viver a coragem de prosseguir... Viemos até aqui, já aprendemos um bocado. Caminhemos, então, mais um pouco... O futuro precisa de nós. Quer melhor forma de nos solidarizarmos em nosso dia, olhando-nos uns nos olhos dos outros, dizendo-nos que sem nossa participação fica bem mais difícil encontrar as trilhas do prosseguir?


(*) Publicado no jornal O GLOBO, no dia do Professor

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Rol de roupas, rol de gentes que viam sem ver...

Escrito em 4/4/2011
Triste eu não me lembrar do nome daquela mulher e, pra falar dizendo tudo, nem do nome nem da fisionomia, mas apenas da prática que cercava sua profissão de lavadeira e passadeira de roupa alheia. É que cada semana era a mesma coisa: na casa cheia de filhos, as roupas sujas eram juntadas e embrulhadas numa grande trouxa, sempre com um lençol em volta que, após dar conta de sua função extra de conter todas as demais peças, era fechado em cima, com suas extremidades em cruz (fossem retas seriam consideradas concorrentes), com o ponto central reunindo as quatro bandas que viriam a ser enlaçadas por dois nós encarregados de lacrar o pacote.

Mas a reunião das roupas a lavar não era fruto de nenhuma ação solitária: a cada peça jogada por uma das mãos ao centro do lençol protetor a ser cerrado em seguida, ia-se anotando, com a outra, o tipo e a característica de cada uma delas, de tal modo a se poder conferir, uma a uma, na semana seguinte, quando retornassem, cuidadas e limpas, tratadas pelas mãos daquela tão humilde mulher, de quem me envergonho de nem sequer ter gravado o nome. Hábito, por certo, construído num ambiente onde se olhava sem ver...

Dos recursos usados para dar qualidade ao seu trabalho, bem me lembro do anil, usado para clarear as roupas brancas, e da goma, para aquelas que, segundo alguns padrões da época, precisariam desse toque a mais para garantir a elegância, em geral aplicada em colarinhos e punhos. Ou, bem branda, em camisas e blusas de cambraia de linho.

É bem verdade que algum olor a fumaça vinha junto com as peças, naturalmente pelo efeito do ferro de engomar de que se utilizava a trabalhadora em seu cotidiano, ele que era sempre aquecido à base dos carvões em brasa que se lhe metiam por dentro. Era pesado e até um pouco barulhento, não só pelos pequenos golpes recebidos de encontro à mesa, como também pelo atrito de sua parte superior com a base, a cada estirada feita pela mulher, em seu trabalho de alisar a roupa que lhe cabia lavar, passar e engomar.

A me deixar ainda mais acabrunhada, tenho a recordar uma outra pessoinha que fazia parte da cena. É que sempre havia um filho pequeno, menino ou menina, a atuar como companheiro daquela mulher sem rosto e sem nome, em suas idas e vindas pela cidade, levando o fruto de seu trabalho às várias casas às quais prestava serviço. Sozinha, ela não daria conta do peso a ser transportado. Fazia-se acompanhar, então, da criança, também sem rosto e sem nome. E pior, sem expressão, silenciosa, a cumprir aquele papel espinhoso e totalmente fora do que deveria ser minimamente aceitável. Olhássemos de verdade com olhos de ver e não permitiríamos que se debruçassem sobre frágeis braços infantis aqueles quilos e mais quilos de roupa a serem conduzidas, certamente de um lugar longínquo, para nossas salas enceradas, cheias de crianças totalmente desprovidas dessa experiência tão devastadora. Confesso: o peso a nos vergar, não os braços, mas a alma inteira, era bem outro...

A mágica que venho tentando fazer para não sucumbir diante da consciência encontrada pela vida afora, quando forço o olhar para ver sem véus o que estava e está em volta (como também aqui dentro, no peito, que arde, talvez como a brasa daquele antigo ferro de engomar), é pensar em como aquela criança, desde tão cedo solidarizando-se com a mãe em seu ofício, desde lá, já vinha se humanizando e virando gente que se sabe em cumplicidade com o outro. O básico de se saber em construção conjunta lhe era familiar. Pelo menos isso: quem sabe, não podia estar sendo inaugurada ali, por ela, a bela e essencial arte de caminhar junto – em prol de si, do outro, de cada um e de todos?

Do lado de cá, falo de mim apenas: até hoje, cá estou eu, aprendendo e reaprendendo, dia após dia, entregue à árdua e perene tarefa de refazer as desaprendizagens. É a incessante construção do olhar, sentir, perceber, colaborar, estar junto, refletir, avaliar, compartir, só para falar do trivial simples. O custo é alto para quem perdeu a chance de suavizar o peso sobre os ombros de outrem, ainda na infância. Na falta dessa lição, sobra a necessidade de tentar cruzar a estrada lado a lado, caminho tortuoso para quem vem descobrindo que os meandros e esconderijos do ver são profundos e irreversíveis. De muito prazeroso, contudo, há o sabor de me saber viva, andarilha – por mim, pelo outro, com o outro, vida afora. Ao contrário de Saramago, que não queria fazer nada na vida que envergonhasse a criança que foi, eu desejo, hoje em dia, na reta de chegada, ser cada vez menos cega e indiferente. Minha antiga dívida era com o menino dos braços fortes: não lhe conheço a face, é verdade, mas quero muito que, num encontro simbólico e imaginário, ele goste de olhar nos meus olhos, hoje em dia... Assim, poderemos finalmente nos ver...  Já se faz hora para tão pouco, para quem – ele e eu – tem a seu serviço dois pares de olhos para ver, dois corações para sentir e a eterna benfeitora razão, para nos fazer entender a como nos postar, ombro a ombro, diante da vida. E do outro.

quarta-feira, 30 de março de 2011

Deixem-me em paz com meu sonho!


Em 30/03/2011

Chovendo no molhado: quase tudo para mim passa pela escrita.  A conversa entre cada ponto de meu corpo – o pedaço que pensa, a fração que deseja, a lasca que indica necessidades – e a mão que dedilha, deixando escorrer sensações, é intenso, inteiro, inacabável. Sonhos, sentimentos, projetos, frustrações, tudo clama por registro, e parece mais apropriado por mim quando passa pela mão salvadora que tece fios e mais fios com as palavras que brotam sei lá de onde...

O encontro com o teclado, hoje, vem por conta da conversa que tive ontem com uma grande amiga, em relação a quem o que me une é muito mais a troca de nossos gostares recíprocos do que propriamente afinidades quanto aos modos como olhamos a vida e dela recolhemos o que vai chegando para cada uma.uma grande amiga, amiga dessas em relação a quem o que me une é muito mais a troca de nossos gostares recíprocos do que propriamente afinidades quanto aos modos como olhamos a vida e dela recolhemos o que vai chegando para cada uma. A gente se gosta, mas não necessariamente a gente gosta do que a outra gosta na vida. Somos diferentes, e isso, pelo menos para mim, é uma lição diária do que é ter afeto por alguém. E digo mais, o mais difícil deles, pois que dedicado a alguém bastante distante do meu cotidiano, quanto ao sentido que escolhemos, cada uma, para nossas próprias existências. Mas, eu dizia, ontem, estando com essa minha grande amiga, falamos de tudo. Tínhamos tempo, passamos todo o dia juntas, muitos engarrafamentos a ultrapassar, portanto, muitas trocas possíveis de serem feitas. Pois, conversa vai, conversa vem, sozinhas, retornando à casa, pela Ponte com seu habitual trânsito lento, eis que mais uma vez eu confesso para ela o meu sonho romântico de ainda viver um grande amor. Eu, sim, aos 65 anos, ainda sonho com um grande amor. E pior: anuncio o sonho, mesmo que absurdo, extemporâneo, até ridículo, no dizer de alguns.

A minha amiga, sempre prática e racional, e, com certeza, coberta de razão, retruca, combatendo veementemente a minha doce ilusão, contando com exemplos de casais e mais casais – conheço todos, ela tem mesmo razão! – que “não são felizes mas têm cônjuges”, falando, inclusive, do exemplo mais recente de uma conhecida, cujo namorado, a julgar pelo que ela ali me narrou, realmente é um parco companheiro, daqueles cuja forma de ser nos levam a pensar ser melhor estarmos sós do que mal acompanhadas. Desatento, egoísta, pouco cortês, realmente um péssimo exemplo do que poderia ser um grande amor para quem já está bem mais além (e ponha-se além nisso...) da metade do caminho por estas bandas terrenas. Segundo ela, portanto, besteira minha, esperar pelo inexistente. Isso seria coisa para quem vem junto, desde cedo, construindo uma história de parceria e cumplicidade. Perfeito! Nisso, ela pensa como eu. Mas, e daí, o que fazer? Não há dado de realidade que me afaste de meu sonho, por mais irreal que pareça ser. E é.

Duas mulheres, dois olhares, duas perspectivas. Com ela, toda a razão, que lhe amacia o caminho que sempre veio e sempre virá. Comigo, apenas a tristeza de me saber uma mulher[1] que sonha.


Hoje, claro!, não consegui terminar o dia sem vir pra máquina registrar o desacerto daquela conversa. O que faltou foi eu me explicar melhor pra minha amiga – e, hoje, pro mundo todo, essa ilusão que a gente tem quando escreve, de que o Outro, qualquer que seja ele, o mundo mesmo, enfim, nos ouvirá e compreenderá nossas palavras e intenções –, repito, faltou explicar pra quem quiser ouvir que o que eu quero é o sonho. Sem tirar nem por: o que eu quero é o sonho!

Deixem-me morrer com ele. Ele está entranhado em todo o meu ser. Ele me faz chorar ao ouvir música, ao ver TV, ao assistir a um filme, trazendo-me fantasias alentadoras... Não há argumentos racionais que dele me afastem. Razão eu utilizo para outras dimensões de minha vida – Ah, e como, e quanto! –, mas, em se tratando da espera do grande amor, deixem-me sozinha à sua espera. Só a emoção da espera dá a dimensão de sua magnitude. Parodiando Liz Luft[2], aqui encerro dizendo em alto e bom som: DO MEU SONHO SEI EU. E sou inteiramente só quando se trata dele...


[1] Homenagem a Vinícius...
[2] Esta autora, em seu livro Lado Fatal, num dos seus poemas, ao tratar da perda de seu grande amor, afirmou, com toda a propriedade: “Da minha dor sei eu”.

terça-feira, 29 de março de 2011

Subir a Serra brincando - a hora é esta!

Publicado originalmente no blog da Campanha SUBA A SERRA BRINCANDO em 6/3/2011
Semana passada ouvi de um amigo que o Egito agora está mais perto de nós do que a nossa Serra que caiu por terra. Tendo a concordar. Desde que tenhamos clareza de que também o Egito passará. Tudo é fugaz. Nós mesmos não resistimos a tanta crueza com que nos deparamos na TV e, talvez por autodefesa, escapar de uma tragédia para olhar outras novas/velhas notícias seja uma proteção que estamos encontrando para não sucumbirmos à propalada impotência que cada um tem diante do caos. Claro que restaria a opção de levantarmos de frente da TV, mas aí são outros quinhentos...

Na verdade, para sermos justos, precisamos reconhecer que muitos já saíram de sua zona de conforto e colaboraram, confirmando a nossa extrema capacidade de ajudar quando uma nova tragédia atinge nossos pares, mais ou menos distantes.

Devemos considerar nesta hora, no entanto, que o temor que se abate sobre quem está perto da população atingida já não é mais a simples falta de bens materiais, vindos dos lugares mais inusitados e distantes, mas é o tempo que durará esta situação “provisória”. Sabemos todos e não vamos nos iludir: trata-se de um provisório cuja extensão de tempo ganhará ares de permanência, tamanha a dificuldade para que cada qual volte a ter uma vida mais dignamente organizada.

Nesse sentido, o grave problema com que se defrontam os prestadores de socorro é a urgência de se providenciar, ampliar e atribuir um caráter de maior permanência ao atendimento afetivo, social e educativo que vem sendo oferecido às vítimas, e aqui estamos nos referindo prioritariamente às crianças e jovens.

Precisamos de voluntários que brinquem, que contem histórias, que façam com que cada criança ou jovem abrigado deixe de ser apenas o ocupante do colchão número tal. As perdas já acontecidas e sentidas na carne por cada um não podem ser agravadas por este limbo em termos da educação e cuidado que são devidos a cada qual. Está em jogo o comprometimento emocional, mental, físico, integral mesmo, de um contingente significativo de filhos de nosso tempo.

Que venha quem puder! Que, pela ação, cada qual possa ampliar os limites de sua atuação como cidadão. Que se apresente quem estiver disposto a subir a serra brincando. O cobertor da hora é este.




[1] Colaboradora da Campanha Suba a Serra Brincando - Recreação Voluntária na Região Serrana do RJ. Contato: recreacaovoluntaria@gmail.com

Sobre enchentes e lixões, sobre os pobres e nós

Morro do Bumba, Niterói, RJ Publicado originalmente no site da Caros Amigos - em 12/05/2010

A semana, como de praxe, foi recheada de leituras. Muita TV também, porque sou noveleira das boas, e adoro uma entrevista... Política também é vício antigo e programa sobre música é sempre caçado - e não raras vezes - encontrado na calada das noites insones. Daí não saber ao certo - não duvido que a idade também contribua para isto - onde li ou vi uma frase que, de imediato, foi se reunir a outras tantas que guardo como lição. Quem souber o autor me avise, é um favor. A lição é a de que "nem todos têm talento para enxergar a realidade". Pois ficou martelando e eu não sabia que tão rapidamente a aplicaria à vida que chegava, desta feita recheada de dor e desamparo: as chuvas que inundaram a cidade, esta que, não sendo minha por nascença, adotei por especial encontro afetivo.
Devo confessar, em acréscimo, que uma outra reflexão veio se somar à ideia do tal raro talento de que trata o autor de que não me lembro o nome. Vem de uma sessão de análise onde eu pude perceber que existem situações que se repetem em nossa vida, situações que nem sempre as percebemos, até que um dia, sem mais nem menos (ou até com muito mais vida e muito menos defesa...), a enxergamos com clareza. Das vezes anteriores não se está preparado para ver, ou acumula-se vida para abastecer o olhar de capacidade de ver. É como se a pessoa vá se fortalecendo para viver o dia em que possa - junto aqui as ideias - ver surgir o talento glorioso que possa trazer lucidez para ver.
Também das sessões de análise surge um outro ensinamento oportuno: o de que a primeira medida para se solucionar um problema é saber-se com um problema a resolver. Não é à toa que o alcoólatra começa a enfrentar sua própria dificuldade diante da bebida quando se percebe como tal. Antes, nada feito. E olhe que nem mesmo assim - seja com relação a que vício for - a coisa é simples...
E o que tudo isso tem a ver com o sofrimento que se abateu sobre uma parcela sofrida dos pobres de minha cidade?
Pausa para pensar. É preciso tempo, é necessário bom senso. É mesmo questão para pensar com tempo.
Morro do Bumba, Niterói, RJO que me assustou diante do que sucedeu - a morte, o desassossego, o desamparo, a aflição, a penúria, a insegurança, a perda da própria história, e tantas quantas outras expressões que puderem vir em meu socorro para significar o que sinto diante da tragédia que atingiu tantos pobres -, o que me assustou foi o que ouvi de inúmeras pessoas que, como eu, são feitas de carne e osso, estudaram, têm a sua casa segura, não sofreram perdas e etc. e tal. De muitas delas ouvi palavras que transformaram as vítimas em autores e responsáveis pela tragédia que se abateu sobre suas vidas. Exponho aqui uma dolorosa síntese:
- "Quem mandou querer viver no miolo da cidade?"
- "Vai me dizer que não sabiam do perigo..."
- "Quando o governo quer tirar, quem quer sair? Ninguém."
- "Pobre é bicho teimoso mesmo... por que não escolheu outro lugar para morar?"
O que me ocorre pensar é que esta nossa chamada "classe média" não pode ver (por enquanto, eu espero) o que de fato acontece. Se cada olhar levasse para os corações e mentes de quem assim fala e pensa a perversidade da desigualdade social como produtora de todos estes males, um "AA social" seria imediatamente providenciado para que a única solução para o caso - a busca da justiça social - fosse ferrenha e coletivamente buscada para que o fosso econômico entre pobres e ricos deixasse de existir. Ou seja: o que sinto - e com quanta dor! - é que a cegueira que se coloca para os não pobres que assim pensam - é providencial. É a saída que encontram, num nível inconsciente, imagino, para viverem o dia seguinte, para saírem de casa e encontrarem os miseráveis que se espalham pelas ruas, podendo prosseguir, continuando a caminhar, sem caírem por terra,  dominados pela dor da consciência enfim encontrada, até tomarem fôlego para irem em busca de saídas, tomando para si a tarefa de construírem uma sociedade humanizada.
É o que sinto. É o que me vi no dever de falar. E publicamente. Se ouvi palavras tão medonhas, perdoem-me se exponho a mim e as minhas. Nelas acredito. Para mim, a busca de talento para construir uma nova realidade também passa pelas palavras.

A leitura de jornais nas escolas


Originalmente publicado no jornal O GLOBO, em 1/2/2007 e no site do Observatório de Imprensa em em 6/2/2007


Hoje, no Brasil, dezenas de empresas jornalísticas desenvolvem programas que levam seus próprios veículos a escolas, o que se constitui em iniciativa de grande relevância para a formação de novos leitores, podendo significar a viva expressão do compromisso social que têm com as comunidades nas quais estão inseridas.
A questão que aqui quero discutir é se também para as escolas tais iniciativas trazem benefícios. Até que ponto a leitura e o uso de jornais facilitam – ou podem facilitar – um processo de construção de conhecimento em que cada um, alunos e professores, seja sujeito que vive um processo que contribua para que cada qual reconstrua o conhecimento sobre os fatos, tomando posições, analisando os diversos ângulos de cada questão, podendo escolher caminhos sabendo o porquê de suas escolhas? Para que a presença de jornais na escola possa trazer benefícios, alguns requisitos são necessários, indispensáveis mesmo. Lembro apenas alguns:

·         a presença do jornal na escola deve estar vinculada à defesa da democratização do acesso ao mundo da leitura, em seu sentido mais amplo, indispensável para a construção da cidadania. Livros de literatura devem chegar aos alunos pela porta aberta, pela leitura dos jornais;
·         o jornal em sala de aula deve ser utilizado garantindo sua análise como objeto de estudo, devendo ser aproveitado em seu todo, pois trabalhar apenas recortes soltos dificulta a compreensão da dinâmica e das características da imprensa pelos alunos;
·         a presença do jornal na escola não pode prescindir de um processo de formação continuada dos profissionais do magistério, em que se dê voz a cada um deles, divulgando, inclusive, suas experiências bem-sucedidas.

Somente profissionais sujeitos podem formar alunos sujeitos

Nesse processo de formação (o que seria dos professores sem seu trabalho conjunto, coletivo?), podem ser enumerados alguns pontos a serem estudados pelos professores nas diversas atividades de formação continuada que venha congregá-los:

a) o cuidado para não se escolarizar o jornal de forma a prejudicar o interesse do aluno por sua leitura. Não se pode correr o risco, por exemplo, de se fazer com o jornal o que muitas vezes se faz com as obras literárias, aplicando-se provas para se conferir o que é uma manchete, uma seção ou uma editoria;
b) o debate sobre a relação entre o trabalho com o jornal e os conteúdos escolares, enfatizando a relação entre a teoria e a prática. Esta deve ser a constante referência para o processo pedagógico, de modo a colaborar para que sejam superadas práticas arcaicas e centradas no conteúdo como fim em si mesmo;
c) as amplas possibilidades de o jornal contribuir para o tratamento interdisciplinar do currículo, já que a notícia já possui um caráter amplo e não aprisionado a apenas uma área do conhecimento;
d) o jornal e sua contribuição para o cumprimento da função da escola hoje (o aluno que lê melhor o jornal não pode ler melhor a realidade?);
e) e, por fim, a discussão sobre a própria imprensa e a sua influência no modo de pensar e agir de cada um.

Para que um programa de utilização de jornal na escola forme leitores deve-se colocar em oposição aos dois mitos que hoje existem em torno do uso do veículo na escola, quais sejam:
·         Mito 1: "A busca da informação na imprensa, em si, é condição para se exercer a cidadania";
·         Mito 2: "É melhor não buscar a informação na grande imprensa já que ela é pelo pensamento das elites".

Superá-los deve significar a promoção de um trabalho que contribua para que todos leiam sim, mas, criticamente, fazendo-se interpretadores da interpretação que cada jornal faz da realidade.
A escola, na verdade, forma valores e atitudes do sujeito em relação ao outro, à política, à economia, ao sexo, à droga, à saúde, ao meio ambiente, à tecnologia etc. Para tanto, os conteúdos curriculares precisam ser desenvolvidos em prol do desenvolvimento de capacidades que permitam que cada aluno compreenda e intervenha nos fenômenos sociais e culturais de seu tempo. O jornal, desde que lido criticamente, pode ajudar – e muito! – nessa direção.

Uma coisa é certa: passe por onde passar a utilização de veículos noticiosos nas escolas, o principal é que os professores estejam vivamente envolvidos na definição, realização e acompanhamento da proposta pedagógica que a envolve.

São eles, sem dúvida, os grandes formadores de leitores com que se conta cada vez mais. Até porque é a possibilidade de ler o que está impresso que pode preparar os nossos jovens para as leituras que vierem a fazer de veículos noticiosos em suas versões on line.

Escute a presidente, secretário!



A ideia que subjaz ao conceito de choque de ordem que está sendo proposta para corrigir as mazelas da Educação no Rio de Janeiro, ao que me parece, traz em si uma visão que contraria as melhores possibilidades de ser oferecida a educação pública, democrática, de qualidade socialmente referenciada, laica e universal que é devida à população de nosso Estado.
Só o fato de serem agrupadas, sob este rótulo, as medidas a serem levadas a efeito para o setor educacional, já sugere que são concebidas com um caráter impactante, imediato, rápido, conflituoso, metódico, disciplinar, preceitual,…, que tragam “pronto restabelecimento” para o doente em estado tão grave, no caso, a educação escolar oferecida pela rede oficial estadual.
Depois do que vimos pela TV quando da tomada do Alemão, numa alegoria tresloucada, posso imaginar que talvez fosse assim o novo Choque: coloque-se o “salvador” Bope Educativo (inspetores, julgadores, avaliadores, controladores…) para invadir as escolas, à mostra, posturas de quem tem certezas já sabidas e culpados já encontrados a priori; e de lá sairão correndo, fugidos, os responsáveis pelo fracasso da ação educativa, os maus profissionais da educação. Porta afora, sairão ofegantes, atravessando a estrada mais próxima, a caminho de casa, entristecidos uns, revoltados outros, incrédulos outros tantos…
Nem o caminho do sindicato será buscado, pois, diferentemente de outros tempos, parece que não tem havido uma relação mais estreita entre os profissionais e suas entidades. E os responsáveis pelo choque da ordem poderão fincar, bem no hall de entrada, a bandeira de sua produção documental (novas portarias, propostas curriculares, exigências, editais,…), anunciarão a boa nova, que é chegado um novo tempo, de paz, de produtividade, de estímulo às melhores competências exigidas dos alunos pelo mercado, tempos de separar o joio do trigo, tempo de prêmios, de uma nova ordem, enfim.
Do meu ponto de vista, a Educação não necessita nem de choque nem de ordem, que dirá de choque de ordem! A Educação não pode ser vista como um bom negócio que se faz rapidamente, diante da sagacidade de quem tem habilidade para fazer crescer lucros e oportunidades. A Educação não precisa (muito pelo contrário!) de que seja estimulada a competição entre os profissionais da educação, como tem sido comum nos últimos tempos.
Mesmo estando em tempos de mais cuidar de meu jardim que de dar aulas, não posso deixar de pedir um favor à equipe da secretaria de educação do Estado: escutem a presidente. Assim, quem sabe, as coisas comecem a caminhar numa outra e boa direção. Sim, refiro-me ao discurso de Dilma (em quem nem votei no primeiro turno; estive com Marcelo Freixo e com quem estava com ele) no momento de sua posse no Congresso Nacional, quando afirmou que:
“só existirá ensino de qualidade se o professor e a professora forem tratados como as verdadeiras autoridades da educação, com formação continuada, remuneração adequada e sólido compromisso com a educação das crianças e jovens.”
Imagino que essa, mais do que simplesmente uma ação, é uma premissa para o sucesso de qualquer política que transforme, verdadeiramente, a Educação: uma nova compreensão acerca do quanto o professor é a legítima autoridade capaz de fazer mudanças que perdurem e que, de fato, transformem, na essência, aquilo que precisa ser mudado. Políticas vindas de fora para dentro, políticas que neguem o professor, políticas que tentem secundarizá-lo, são inúteis. Dão no que aí está. E mudar para permanecer, não é o caso (Ou é?).
Imagino que reforçando o cotidiano da escola, deixando valer o poder dos profissionais em se influenciarem mutuamente, estabelecendo-se o trabalho coletivo na escola, com um sentido real para todos poderem repensar suas práticas, num processo de formação continuada em serviço, revendo-as em conjunto, é um começo.
O professor, com autoridade, terá poder de exercer influência, juntando o agir e o pensar num só sujeito, sem que uns valham mais que outros. E sem que haja necessidade de fuga. Que, aliás, pelo que pude saber, já tem havido muita, com grande número de desistências de mestres abandonando a carreira.

(*) Artigo publicado originalmente no sítio da Caros Amigos em 26.01.2011

Entrevista com Carmen Lozza

Se o aluno não entende a influência da mídia, está desconhecendo a si próprio

                                                                                         Por Katarine Flor do NPC (*)

O curso de Jornalismo de Políticas Públicas Sociais da UFRJ, coordenado pelo professor Evandro Ouriques, recebeu no dia 27 de abril (**) a professora aposentada da UFF Carmen Lozza, (...). Ela ressaltou a importância de se levar o jornal para as escolas, e incentivar a leitura crítica da mídia. "É um recurso didático, que precisa ser conhecido, lido e interpretado". Para ela, é necessário buscar a reflexão crítica dos alunos sobre a influência da mídia nos indivíduos, para que eles saibam fazer escolhas. E enfatizou o compromisso social da escola nesse processo.

Leia a entrevista feita com Carmen Lozza.

BoletimNPC - A senhora falou sobre a influência da mídia nas escolhas individuais e que é importante trabalhar uma visão crítica com os alunos. Por que isso é tão importante?

Carmen Lozza - Se o aluno começa a perceber que ele não é o dono total de sua vida, e que sofre uma influência enorme da mídia, ele vai se conhecer melhor. Vai entender seus limites e suas possibilidades para intervir. Não adianta formar um aluno que acha que é o "bam bam bam", e que pode tudo. Ele vai ter uma avaliação de conjuntura completamente equivocada, porque ele não pode tudo não. Também não é positivo um aluno que acha que tudo é determinado, e que não pode nada. Este aí então vai ficar alienado.

Por isso é fundamental contribuir para que ele faça essa análise crítica. Quando ele começa a entender a influência que sofre da mídia, ele vai se assenhorando dele próprio, das suas próprias capacidades e das suas condições de intervenção.

A expectativa que eu tenho é que ele possa fazer escolhas melhores. Não só em relação à leitura, mas tudo em sua vida. E que ele possa escolher em quem vai votar, o que pode fazer no grêmio dele, qual a proposta mais adequada. Ele vai ficar mais lúcido em relação aos seus limites e possibilidades. Se ele não entende a influência da mídia, ele desconhece a si próprio.

BoletimNPC - Ao trabalhar essa questão nas escolas, como a senhora percebeu essa mudança?

Percebo alterações quando eles começam a ter atitudes na própria escola, e tentam mudar alguma coisa. Quando o aluno, por exemplo, lê no jornal sobre uma vala que está fétida do lado da escola, e ele vai se informar sobre aquilo. Que vala é aquela? Por que está assim? Aí ele descobre que não é um valão, mas sim um rio que está completamente poluído. E vai tentar buscar uma solução para aquilo. Vai falar com os colegas, com os professores, e tentar se juntar para fazer alguma coisa para mudar.

BoletimNPC - A senhora acredita que os professores já estão muito conformados e desestimulados, e que, por isso, não buscam esta leitura crítica utilizando os
jornais?

Tem tido muito desânimo, sim. Claro que existem aqueles que não desistem, mas o professor está muito empobrecido. Muito entristecido. É isso que eu tenho visto na maioria das vezes.

Ou então, quando a escola é particular, ele está sem espaço, sem opção. Tem que trabalhar em instituições onde não tem poder nenhum. Então ele tem que seguir aquela "cartilha". Oferece um ensino apostilado, onde tem que passar o conteúdo daquele dia. Não tem espaço nenhum para trabalhar jornal, nem nada diferente daquilo que está naquela apostila.

BoletimNPC - Durante o curso, a senhora falou sobre o pensamento crítico, mas que ele vai além de estimular a opinião. Como é isso?

A opinião não tem compromisso com a verdade, com a ciência. Eu posso ter a opinião mais diversa sobre vários assuntos. Agora, se eu me disponho a tentar entender uma determinada questão, não é mais uma opinião que fique na mera vontade de cada um. Eu tenho que buscar indícios mais científicos, fazer relações, localizar melhor aquilo, estudar muito. Eu não posso fazer uma crítica sem ter uma base teórica que possa me dar uma fundamentação para entender melhor aquele assunto. A opinião é uma questão até de gosto. Pensamento crítico é outra coisa.


(*) Originalmente publicada no Boletim do NPC.
(**) de 2009.

segunda-feira, 28 de março de 2011

Sai um filé com fritas, aí, meu camarada!

 Escrito originalmente em 2011

Uma vez que fui a uma reunião em uma escola na Barra da Tijuca, pertencente a uma destas redes de ensino privadas que têm mil filiais espalhadas pela cidade, pelo estado, até mesmo pelo país, as chamadas escolas apostiladas. Pois, vocês não vão acreditar: atende-me uma coordenadora, uniformizada, com cara de gerente de banco ou aeromoça, toda de azul marinho, na blusa o emblema da escola no peito, bem na direção do coração. A imagem já era tão pasteurizada que me causou arrepios. Mas, tentei não criar preconceitos, afinal de contas, marxista de carteirinha, não queria me deixar levar pela aparência, estas coisas de quem tenta buscar a tal da unidade entre aparência e essência. Era ir adiante e não me deixar levar pelo impulso de fugir dali, às pressas...

Pois não tive êxito. Conversa vai, conversa vem, enquanto caminhávamos em direção ao auditório onde me aguardavam os professores com quem eu conversaria sobre Mídia e Educação, o que vocês imaginam que a moça possa me ter dito, com galhardia, certa de que sua afirmativa guardava grande sabedoria e que era adequada para aquele momento de jogar conversa fora tão comum para a circunstância? Juro que teria sido melhor se tivéssemos ficado naquele feijão-com-arroz de o-dia-está-quente,-ontem-esteve- mais-frio,-a-chuvinha-veio-em-boa-hora, ou coisa que o valha...

A pérola foi a seguinte:

- Sabe, professora, nossa meta este ano é alcançar a qualidade de ensino, custe o que custar. Temos feito reuniões e mais reuniões com os professores de todas as unidades para debater a nossa intenção. O exemplo que tenho dado para eles e que acho pertinente é que a nossa rede tem que se espelhar no Mc Donald’s. Quando vamos a um Mac Donald’s a batata frita não tem a mesma qualidade, esteja a filial onde estiver? Pois é isto que queremos: que o nosso ensino seja como a batata frita do Mac Donald’s, sempre igual, Afinal, todos têm que receber o mesmo conteúdo, não é?

O bom é que Deus existe e me protegeu naquela hora – para que eu não tivesse tempo para responder nada, com o risco de criar um clima desagradável com a minha anfitriã, eu que já via fugir garganta agora, já pulando na gola da blusa, algumas palavras que iriam tentar fazer conjecturas sobre algumas possíveis diferenças entre batatas fritas e gente. Eis que uma porta se abriu e era o auditório à nossa frente, muitos olhares em minha direção, hora de cumprimentar os colegas e começar a falar. A conversa, com a cumplicidade de Deus terminava ali.

Mas, para que eu pudesse dormir tranquila, na noite que viria em seguida – e nas seguintes, por suposto -,  arranjei um jeito de, naquela fração de segundos que me separava da moça-que-vê-gente-como-batata frita do auditório cheio, com quem eu esperava dialogar com o coração quente de vontade de tratar das mazelas e perspectivas da escola, pois eu tive tempo de incluir em meu discurso um trecho que tratava justamente de como a mídia nos massifica, tentando fazer de nós uma maçaroca, todo mundo meio de um tom só, de um gosto só, de uma escolha só, quase como as batas fritas do Mac Donald’s, iguaiszinhas onde quer que estejamos...

Nada disso, aqui resistimos, aqui refletimos, aqui insistimos em termos direito à diferença, ao pensamento crítico. Aqui podemos olhar e tentar ver mais além, com todo o direito de gostarmos de bife mal ou bem passado, “ao ponto”, se for esta a preferência, para acompanhar batatas, quaisquer que sejam elas, fritas, assadas, chips, gratinada, à portuguesa, Rösti, até as da caixinha vermelha do Mc Donald’s, todas deliciosas. No meu ponto de vista, Há outros...