VIDA, E NA VEIA!
16/02/2018
Deu um dia, nada. Dois, três, quatro, o mesmo - total ausência de um tema, qualquer que fosse ele - uma banalidade, uma observação risível, um registro ou uma lembrança - que pudesse me instigar a escrever. Logo eu que sou movida a palavras e que, em jejum, a cada dia, faço da escrita o elemento vital capaz de abrir o traçado dos momentos pós-aurora em seus pigmentos, até disfarces. E é verdade, desde que soube da seriedade do tratamento a que me submeteria, emudeci. Não de imediato surgiu a consciência quanto ao silêncio recém instalado. A lucidez surgiu alguns dias depois da consulta ao oncologista, quando vim a saber da demorada sequência de sessões à qual terei que me submeter. Apenas percebi o tanto de dias sem escrever. Era como se, diante da ardilosa fase da vida que se impôs - e que eu tão bem vim respeitando e absorvendo, com meu bom humor sempre alerta - agora tenha sido introjetado de verdade o seu real percurso como fato consumado (e doído). A coisa é pra valer. E que, com isso, tenha sido expulso o meu, tão intrinsecamente meu, gosto pelas emoções do falar ao mundo pela via da escrita. Não bastou o naco de mim levado ao lixo hospitalar no dia 8 de dezembro. A história vai além, não para aí é faz pensar...
Estarei expulsando as emoções que me fazem pulsar diante da vida para que o organismo faça uma certa abstinência para receber um outro tipo de química, curativa mas arrasadora? O motivo do engasgo no palavrório virá com o tempo, imagino. Por enquanto, apenas a surpreendente constatação. Emudeci. E hoje, desperta deste tempo tão quieto, vi-me impelida a falar do meu silêncio, tão raro.
Que minha aparência se altere! Que minha vaidade se aquiete! Que minha química com as palavras tire seu merecido ano sabático! Eu me enquadro, vá lá. Mas que seja breve! Não há salvação fora do prazer. Pelo menos assim aprendi até os tempos em que a supresa de um câncer - e no coração da minha feminilidade - veio me tombar diante da fragilidade de pretensiosos planos de viver sem esse tipo de surpresa, maligna. Com certeza, eu estava carecendo desta lição de humildade. Somos, sim, ínfimos insetos com pouca margem de manobra diante dos temporais mais avassaladores postos no caminho.
Que venha o líquido restaurador e prometidamente eliminador de riscos! Em minhas veias já corre vida suficiente para receber essa influência - que guarda tanto mistério e poder! Da nova mistura injetada hão de advir novos delírios, sonhos e constatações. E palavras, por suposto. É o que espero. E faço isso, em estado de total ignorância quanto a efeitos e bizarras especulações, abrindo meu corpo ao que virá e abrindo mão, por um tempo, de minhas palavras de pensamento e emoção.
Apronto-me, sem mais dizeres, se esta parece ser a primeira regra do jogo. Desprendo-me de dizeres. Entrego-me ao novo e ao medo que ele apregoa, mesmo sem nenhum anúncio explícito. Pago o preço! É vida. Vamos a ela!
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