sexta-feira, 4 de novembro de 2016

FAREJANDO POSSIBILIDADES
 (escrito em 4/11/2014)
"As palavras, Carmen Lucia, tentam mas não alcançam as emoções. E, o que ainda perdura, ruas, casas , lembranças, caminhos trilhados e até pessoas não trazem de volta o que passou. As vezes que retornei a Campos, pareceu-me deserta. Não só de tudo que dela trago, como até de mim, do que fui diante do que sou. Forasteiro no próprio lar." 
Aloísio Svaiter
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Você, meu amigo Aloísio Svaiter, me saculeja com a sua bela maneira de dizer da incompletude das palavras; da impossibilidade dessas malandrinhas darem conta de ir às entranhas, de lá trazendo com nitidez o que é e que importa. Para mim que, chegando de viagem, queria mesmo era escrever sobre as duas irmãs adoecidas e seus legados, deixo para depois tal desejo, até porque é bem mais complexo e avassalador.
O amigo me pega mesmo de mau jeito em função de minha eterna crença de que as palavras nos formatam e nos tornam o ser que vamos sendo. Até já discuti, no bom sentido, Aloísio, com um grande amigo –  André – que você não conheceu, sobre a relação entre História e Literatura, ele sempre apregoando que o que existe, de verdade, é a Literatura, é o dito, é o discurso, não o acontecido, em si, esse permanente desconhecido.
Vejo-me estudando análise de discurso e tentando captar a força do entendimento de que o que nos chega em forma de discurso acaba por dar feição à nossa subjetividade. É a menina que, desde pequena, escuta que é frágil e acaba por se acreditar assim. E pode nem ser tanto. Ou, não raras vezes, não é. É o rapaz que escuta que é o gostosão da mulherada e que acaba por tornar essa uma verdade absoluta e não entender que não é bem assim.
Aprendi a me dizer que “depende”! Sempre depende! Mas a escuta internalizada cria nossa fisionomia emocional e vai-nos colocando em encruzilhadas pela vida afora e adentro. Duro é derreter as certezas e confrontá-las com o que vem vindo e com sentidos diversos!
Creio, Aloísio, que, como em tudo na vida, temos mesmo é que seguir uma das lições mais preciosas que um outro campista tão querido que já nos deixou – José Américo Pessanha –  nos legou. Refiro-me à incerteza das coisas e da sempre indispensável atitude de dúvida que devemos endereçar ao já estabelecido como verdade sempre que com ele nos defrontemos. Duvidemos, pois, da capacidade das palavras como também da sua incapacidade. Vamos continuar testando sua força, seu poder e seu efeito sobre nós. E sobre a vida. Viver não é também ir farejando possibilidades?
Conversinha boa essa... (E deixe-me correr, se não me atraso para a terapia, com acento no primeiro a, como dizem os argentinos...)


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