RUA SANTA CLARA, 142, APARTAMENTO 801
Descalça, como gosto, em meu apartamento na rua Santa Clara (Anos 70) Hoje dei de pensar nesta foto que postei ontem, cumprindo o desafio de uma amiga. Rua Santa Clara, 142/apartamento 801. Copacabana. Lá morei por um par de anos. Deve ter sido este tempo. Não sei ao certo. Dali me mudei para a bucólica e inesquecível Pracinha do Bairro Peixoto, aí já casada. Juan Carlos e eu fomos juntos para lá e foi de lá que saímos para viver em Niterói, de onde não mais de mudei, salvo o tempinho que vivi em Atafona, com os filhos pequenos, na Casa do Galinho. |
Mas esta foto sou eu naquele tempo. Sem tirar nem por. A esperança subjaz, perpassa, ilumina.
Não via TV, pelo contrário, combatia a sua influência nefasta. Aí alguém me deu esta mínima, que nunca foi ligada. Era um enfeite. O som era meu "Quindim de Iaiá". Música era central na vida. Fiz um trabalho de tradução, ganhei 7 mil cruzeiros (ou qual seria a moeda na época?) e saí do banco, na Praia do Flamengo, com o dinheiro vivo na bolsa, e fui direto à casa Garçon da Raimundo Correa e o comprei. O primeiro disco colocado foi o do Quarteto em Cy, comprado com mais uns 30, junto com o som. Pionner, se não estou enganada. Ou Pionner foi o seguinte, sei lá...
As cerâmicas vinham de onde eu ia. Com certeza a maior veio de Salvador, uma igrejinha pequena, de Lima e uma outra, também pequena, de Cuzco. Na época ainda não colecionava bonecas. O dinheiro em viagens era sempre medido, as cerâmicas eram sempre as que me agradavam dentre as mais baratas. Menores, portanto.
Na parede há um cabide, feito por JC, onde uma bolsa de couro está dependurada. Ela é inesquecível. Cheia de repartições. Usei demais. Vejo-a com nitidez e quase sinto a maciez deliciosa de seu couro. Pena que acabou.
A mesa, feita por Juan Carlos, ainda crua, já não a tenho mais e nem desconfio em que esquina da vida se perdeu... Muitos jornais na cesta. Com certeza, apenas o JB, que era o que eu lia então. O GLOBO, nem pensar! Aliás, quem introduziu o GLOBO em casa foi Juan Carlos. Custei a me acostumar. Mas foi até bom. Anos mais tarde vim a trabalhar com ele diretamente e foi um período de intensa realização profissional. Tempo de lidar com um monstro e tê-lo à mão para desmistificá-lo e perceber suas garras e venenos. Mas isso é outra história... O paneau não sei de trouxe da Bolívia ou do Peru... mas foi daquela viagem à América Latina em que conheci JC. Eu e a amiga Vera.
O anjo é um caso à parte. Único quadro de Renato, meu irmão, de que eu gostava. Ele me deu. Anos mais tarde, quando nossos caminhos afetivo-ideológicos já estavam irremediavelmente interrompidos, alegou o agrado feito antes e eu o devolvi, orgulhosa. Pois minha querida cunhada Maria Regina o comprou dele e me deu de volta no meu aniversário, me fazendo quase morrer de emoção. Eu adoro meu anjo e ele hoje vive aqui, bem ao meu lado. E é isso, até num irmão-desafeto encontro algo que ame. Até Bolsonaro há de ter uma qualidade. E pensar assim me faz humilde, o que julgo fundamental, na minha pretensão de ser tão tão tão. Sou, mas não sou. O outro não é, mas é (um pouquinho que seja).
Aquele foi um tempo bom. O apartamento era minúsculo e ali vivi intensamente. Na foto não aparece, mas numa das paredes havia um armário Gelli, que eu trouxe dos tempos em que dividi um outro apartamento com Anezinha Ana Helena Goulart).
Vou aqui ficar pensando um pouco. As palavras cumpriram sua parte, a de registrar o visível. Para o mais, as rememorações, elas se tornam minúsculas e não dão conta. Em silêncio, vivo melhor esta hora da saudade.
Vou buscar em mim o sorriso que antevejo, ainda que meio de banda, na foto sobre a qual me debruço. EU ERA FELIZ E SABIA...
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