DIFERENÇAS INDIVIDUAIS
(Escrito em 2/10/2013)
Houve um tempo em que, pela natureza de meu
trabalho, eu visitava muitas escolas, para me reunir com professores.
Programávamos uma reunião e lá ia eu no dia e hora marcados para estar com eles
e conversarmos sobre educação e sobre o meu velho tema – o de como ler jornais,
sem nos deixarmos assujeitar pelo seu discurso e deles fazermos o mais
proximamente possível um instrumento que pudesse fortalecer nossa condição de
leitores que vão além do que, na aparência, querem nos fazer crer. São tempos
que me deixaram lições e mais lições que, vez por outra, me invadem e me
felicitam.
Uma delas – essa é definitiva: nas escolas
públicas, por mais que os governantes, cada vez mais, encontrem maneiras e
gestos de se distanciarem do que é uma educação pública e de qualidade para
todos, nelas há sempre um grupo que resiste, nem que seja extremamente
reduzido, sempre criando alternativas de levar seu compromisso social ao
encontro daqueles que estão sob sua direção em busca da almejada cidadania. E
isso, na maioria das vezes, nas escolas do município do Rio de Janeiro, senhora
secretária! Procure olhar e ver, com olhos educadores e não burocratas, por
favor!
Mas, juro!, por mais que queira homenagear meus
colegas em greve (não deve ter sido à toa que foi deles que comecei a falar), a
minha intenção aqui é falar de um assunto bem outro. E eu vou a ele.
É que, naquele tempo, havia um jovem senhor,
adorável, competente, tranquilo e, além de tudo, exímio motorista, que era quem
me conduzia às escolas, diariamente, aguardando-me para trazer-me de volta à
casa, após o cumprimento da tarefa. Sua principal característica era a de ser
extremamente paciente. Tardasse eu quanto fosse – duas, três, sei lá quantas
horas em meu encontro com os professores – na saída, lá estava ele, totalmente
tranquilo, imóvel, sem nada fazer até eu voltar ao carro, para tomarmos a
direção de casa novamente.
Pois, eu, sempre em minha superprodutividade,
tipicamente “pessanha”, daquela que não passa pela sala, vindo do quarto, sem
levar qualquer copo ou o que for para a cozinha, equilibrando o que preciso for
nas mãos, fazendo mágicas impensáveis com os imaginados – e ali tão necessários
– setenta e dois dedos, para não perder a viagem, pois, eis, que, num dos dias
em que volto ao carro, com certeza, mais “hiperativa” do que o usual, entro no
carro e digo:
- “Agnaldo, vc está aí tão quietinho, Agnaldo? Como
consegue? Vc não gosta de ouvir música enquanto aguarda?”
- “Não, professora...”
- “E ler, Agnaldo? ... Palavras cruzadas, já
tentou?”
- “... Huuuuuuuuum, palavras cruzadas... não...”
- “Um livrinho miúdo? Uma revista? Nada?”
- “Não, professora. Sei lá... Ah, a senhora sabe de
que eu gosto mesmo, professora?”
E eu, pronta para me aliviar com a enfim
possibilidade dele vir a falar de uma ação além da paralisia que se mostrava
evidente, me animo toda:
“- De que, Agnaldo???????????”
- “De esperar, professora!”
Voltei para casa em estado de choque, creio até que
cochilei na travessia da Ponte. Nunca, nem lá atrás no curso Normal nem nos
manuais de Psicologia com os quais mais tarde vim a tomar contato, eu entendi,
tão concreta e sabiamente, o que são diferenças individuais. Isso, para euzinha
– que para qualquer possibilidade de espera (em aeroporto, em sala de espera de
médico ou dentista) tenho sempre algum antídoto, nem que seja aquele
amarfanhado e mais que relido Manuel de Barros, que sempre dá para ler mais uma
vez... – é lição para guardar. E vive la différence!
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