PARALELAS
26/8/2016
Nunca se encontram. Nunca mesmo. Uma vai numa direção. A outra, bem sabemos, segue no mesmo rumo, mas num outro nível, numa outra sintonia, sem dar nem uma mirada para a que sobre ela busca seu próprio norte. É como se uma estivesse na altura do fio do poste da rua em frente da casa azul, aqui mesmo, em frente de casa; e a outra, linha também, reta também, mas postada bem mais acima, na altura dos aviões que fazem rota também por aqui, muito mais acima da casa azul e das que estão a seu lado, em sequência. Até da verde, de que tanto gosto da tonalidade.
Uma cá perto, outra mais acima, uma mais visível, quase à altura das mãos, sendo até possível alcançá-la se contarmos com o apoio de uma escada de eletricista, por exemplo. Para a de cima, não, já não é assim tão acessível, dá mais trabalho percebê-la; tocá-la, então, impossível. É bem mais distante para o alcance da visão e se houver árvores pode ser até que fique encoberta por algumas das mais frondosas.
Uma aqui, disponível a olho nu, próxima, quase intrusa, basta que se lance o olhar para a frente e a encontramos; a outra, nem tanto, carece de ser procurada, desvendada, nós nos oferecendo para ir ao seu encontro.
São linhas paralelas. A do poste e a do azul do céu.
Por que penso nelas? Simples. Apenas porque me informo. Se o faço pela paralela mais disponível, a TV e a grande imprensa, sei coisas. Se, insatisfeita, vou à cata de outras informações, menos junto de mim, sei OUTRAS coisas. As notícias não se encontram. São paralelas de verdade. Como aprendi nas aulas de Geometria.
As personagens que insistentemente povoam os jornais são uns, criminalizados e exaustivamente acusados. Já na outra paralela, o mundo e os maus são outros. Parece filme de ficção: as muralhas são intransponíveis entre as paralelas da informação. Bandidos e mocinhos não frequentam as mesmas linhas. Nem sequer se cruzam. Como nas belíssimas escadas de Chambord, onde quem sobe não cruza com quem desce, sob nenhuma hipótese.
Conjecturo: temos mesmo que ir atrás do difícil, do oculto, do menos à mão, o fácil, me parece, nos aprisiona no senso comum e na impossibilidade de desvendar quem se esconde atrás das muralhas da obviedade.
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