ACORDA, DIA!
(Escrito no dia
15 de junho, quando completei 70 anos)
Acorda, dia! Anda, não se faça de rogado! Pensa que só
porque vc todos os dias me expulsa da cama - com seu vigor, poder e façanha -
pode retirar de mim a possibilidade um dia sequer chamar você para fora das
cobertas estreladas de junho, para mostrar minha luz do encanto
mais-pé-no-chão-de-quem-começa-a-se-alfabetizar-no-que-é-ser-alegre-pela-glória-de-chegar-aos-setenta
anos?
Sai fora,
moleque dia! Hoje sou eu quem acorda você e o retira de seu merecido descanso,
pois que estou sendo despertada pelos deuses da alegria, noite ainda, lavando
os vestígios da noite com a claridade de meus olhos abençoados. Abençoados por
simplesmente existir. Existir e acordar. E acordar cercada de proezas, de
amores, de feitos, de dores, algumas até merecidas, outras meio fora de
propósito aos olhos de minha condição de pequenino grão de pó de nada, mas
dores também ensinantes, por mais que o tempo não as afaste de todo de todos os
meus dias de antes e dos que virão...
Não vou me
estender muito. Não que não queira, mas não posso. Você vai chegando veloz, só
para mais uma vez demonstrar o seu poder e me reconduzir à minha real condição
de pó de coisa quase nenhuma... E se eu escrevo muito além disso aqui, você
acaba surgindo glorioso, cheio de si, e cassa a minha saudação de querer
acordá-lo. Seu tempo é mais rápido do que o de minhas mãos ao teclarem o que me
vai no peito.
Voltarei a
falar. Hoje, por enquanto, é só agradecer à vida que me concede o prazer de
chegar até aqui, acompanhada de pessoas e de situações que me fazem cheia de
mim, repleta de amor, não desistente de aprender a existir. Em especial, aos
amigos, da família - de sangue e da que venho construindo durante estes 70 anos
- que no sábado me surpreenderam com a festa mais linda e emocionante de que já
participei. Tudo vindo do coração das pessoas. Tudo para dizer que vale a pena
estarmos por aqui por estas plagas. Apesar de tudo. E muito bem acompanhada.
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