quarta-feira, 27 de setembro de 2017

MÃO E CONTRAMÃO
27/09/2017


Certa vez prestei uma consultoria a uma grande empresa e, além do que significou aquele período em que aproveitei tudo quanto é brecha para ir construindo a limonada possível diante dos limões que me eram servidos, lá fiz belas amizades. Talvez a mais perene e que mais acariciou meu coração foi a que fiz com uma secretária super severa que, não sei por que cargas d'água, veio a gostar de mim, o que acabou por nos aproximar a ponto de nos tornarmos amigas de verdade. Quase nada tínhamos e temos em comum, mas talvez a sinceridade com que tentamos lidar com as circunstâncias seja o que nos tenha aproximado. Ou sei lá o que, o fato é que nos gostamos e, de nossas diferenças sempre fizemos motivo de sadias trocas e bem viver. Entre mulheres, em particular, é assim, não havendo competição, as divergências podem ser as mais profundas, que tudo segue a contento. Nada se põe no caminho.


Desta criatura adorável, franca a não mais poder, nunca consegui me esquecer de um conselho que me deu numa certa ocasião: "Carmen, aqui dentro, nunca demonstre fraqueza, nunca aparente pobreza, nunca dê mostras de que está com algum mal estar, doente, nem pensar! Nada! Aqui, só tem vez quem é bem sucedido. Ao menor sinal de fragilidade, vc fica mal vista. Isso aqui é um grande faz de conta, cada qual demonstrando o que não é para ser minimamente aceito, e sobreviver"


Minha primeira reação foi de pavor, daquelas sensações que acontecem e é como se tivéssemos dado de cara com a parede. Meio zonza, respirei fundo, mas vim pra casa com aquela ponderação a consumir minha capacidade de mirar as coisas que estão no mundo. Foi o que fiz e entendi aquele tipo de lógica. Afinal, minha querida amiga apenas verbalizou o que é o modus vivendi em que nos inserimos quando adentramos qualquer fatia desta sociedade de valores indigestos, robustamente unilaterais. Aquela era uma fala dessas que não dá pra gente esquecer jamais. E eu nunca me esqueci. Até repasso para uns e outros. Jovem em momento de entrevista de trabalho, se me consultar, pode ter certeza, vai ouvir de mim algo parecido. 

Mas, volto ao ponto, o de ter que aparentar saúde, bem estar, boa vida, sucesso e que tais. É que acabo de tomar conhecimento de que a Casa do Saber vai oferecer um curso sobre a temática da Literatura Infantil, e me emocionou ver o release que prepararam para anunciar a atividade. Vejam só:

“O sofrimento nos constitui como humanos, mas temos frequentemente a tendência a colocá-lo no fundo, escondido, abafado, como se ao sofrer fôssemos menos fortes. Ainda costumamos entender as vulnerabilidades como fraquezas, o que nos impede de aprender e crescer a partir delas. A literatura infantil, através de narrativas textuais e visuais, pode contribuir para explicitar as dores e potencializar em cada leitor a potência humana de transformação que vem do fundo, da tristeza. Acreditamos ser importante que educadores e profissionais que lidam com a infância abram espaço para a escuta sensível da criança, possibilitando a expressão de sujeitos que nem sempre vivem em um mundo tão cor-de-rosa quanto podem supor os adultos.”

Com esta explicação, só pode ser coisa muito mais que boa. Na contramão da lógica dominante. E fiel aos padrões de um ser humano real e repleto de vida. Estou super feliz de saber desse evento! Coisa rara de ver! Talvez eu avise à minha amiga para se inscrever.

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