terça-feira, 16 de agosto de 2016

Remendos necessários
(Escrito em 16/08/2015, relido hoje, um ano depois. E como gostei!)
 
É uma mania de família a de se ter sempre em casa colchas de piquê. Enxoval sem colcha de piquê está irrecuperavelmente incompleto. Isso vem de geração em geração. À rouparia de cada casa, podem ser acrescidos todos os edredons mais modernosos e fofos, os cobertores mais macios e acolhedores, que a colcha de piquê não perde o seu lugar.
Basta se chegar à casa de qualquer das filhas ou netas de dona Neném que para a dormidinha de depois do almoço ou mesmo para a boa noite de sono, o que vem oferecido, junto com as demais delícias da acolhida, é uma colcha do tipo, algumas ainda daquelas mais antigas, outras com padronagens mais atuais, mas do mesmo gênero.
Eu mesma tinha uma - branca, de casal - que não sei onde foi parar. Não sei se acabou com o tempo, se envelheceu e passou a ser proteção de um dos três cães ou se foi uma das perdas dos fatídicos assaltos onde perdi minha casa quase inteira, antes de me mudar pra cá. Ali, até a camisola do meu batizado, toda em renda, de mais de metro de comprimento, que ficou comigo só em fotos, foi embora, junto com todo o resto. Nem é bom lembrar! Ou é, porque teve tudo que ficou, inclusive meus filhos e eu (às vezes eu me esqueço de ver o lado cheio do copo).
A rememoração da colcha me chega por conta de que, desde que vim de viagem dei de me proteger no soninho tradicional pós almoço com uma dessas colchas, a que me ficou de mamãe, até bem simplinha, estampada, desbotada, mas que tem sido a minha escolha (vá se entender!), quando quero dar uma descansada sem desfazer a cama, apenas repousar com algo suave sobre os pés neste inverno cujo calorzinho tem sido adorável.
Pois, mais do que esta rotina que criei, espontaneamente, de dela me utilizar em movimentos de proteção ao corpo, surpreendeu-me hoje, sem mais nem menos, como soe acontecer comigo - que simplesmente vou tomando rumos, sem planejar nem estruturar métodos quando quero fazer algo - dar-me conta de que me pus a analisar o tecido já esgarçado da colchinha de dona Neném e colocar-me a cerzir um ponto dela, bem central, que estava mais vulnerável.
Cá com meus pensamentos: estes retornos e contornos, quando se aparam arestas (ou se cortam fiapos...), quando se percebem buracos e trata-se de preenchê-los, quando se alisa o que se tem, renovando-o com a nossa ação cicatrizante, coisas assim, pode não ter nenhum vínculo aparente com nossos tecidos internos, mas como são bons de viver e de sobre eles pensar e conjecturar... (Por mais que alguns me julguem séria demais em relação aos acontecimentos).

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