quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Em 18 de novembro de 2013

ELE, O TRÊS, E SUA MÍSTICA

Começa com a própria Santa Madre Igreja – são três em um – Pai, Filho e Espírito Santo. Ainda no terreno da vida cristã, em que dia Cristo ressuscitou? No terceiro. E se continuarmos nos indagando sobre a misteriosa força do número três, basta nos lembrar de que Pedro, o primeiro papa, negou a Cristo três vezes, antes do galo cantar anunciando uma nova manhã. Mais um exemplo? No nascimento do Cristo, foram três reis magos que vieram saudá-lo.

Exemplos não faltam. No teatro também são três sinais e é com esse último que é dada a partida para o espetáculo. A mãe quando dá um ultimatum para o filho que a desobedece também se vale do três, como limite para a sua tolerância – “Menino, venha cá! Um, dois e... (muitas nem chegam ao número fatal e só pelo tom ameaçador de sua voz, já fazem a possível vítima recuar e a atender, desistindo de seu intento. E não há dúvidas: quem amedronta mesmo é ele – o três – que, mesmo antes de ser dito e proclamado dá a senha de que “o tempo pode fechar”.

Os mosqueteiros, por sua vez, também reforçam a mística, pois que eram três – sempre alerta e indomáveis a cruzar os campos nos arredores dos palácios medievais... E não para por aí... O chapéu, cantado e decantado nas escolas pelos pequenos, quantas pontas tem? Três, claro!. Ou não é assim: “O meu chapéu tem três pontas, tem três pontas o meu chapéu...”?

As irmãs da família da Gata Borralheira nada mais eram do que três moçoilas, a eleita – jovem, bonita, pronta para ser escolhida pelo príncipe encantadíssimo – , e as duas irmãs, mais coadjuvantes impossível, presentes na história, a esta altura fico a supor, só para reafirmar que haveriam de ser três as envolvidas no fato que cruza os séculos a nos atormentar, a nós, mulheres, todo o tempo ansiando por ter pés, mãos, pescoço, nádegas, o corpo todo, mais a alma, os gestos, a fala, o pensamento, adequados para a escolha do grande amor que há de nos tirar da condição de irmã má e feiosa.

Na Política, não podemos nos esquecer dos defensores da Terceira Via. Nem dos esotéricos que falam do Caminho do Meio, ele mesmo, o terceiro, como aquele que pode se sobrepor ao de cá e de lá e significar o equilíbrio por tantos buscado, a duras penas. Sem falar do materialismo dialético, também tido como um terceiro método, o que pode ser capaz de superar o objetivismo puro e simples e o subjetivismo, centrado apenas na força do cada um...

Nas historinhas do gênio da lâmpada, quantos desejos se pode pedir para que ele os faça cumprir, com o seu poder vindo da lâmpada mágica? Nem preciso repetir. Todos sabemos e ele aí está novamente a dar provas de seu poder, ilimitado – o três.

Três, para tudo,portanto, parecia ser um número potente. Por que não para mim?

Fui nessa e qual não foi o resultado? Provo aqui, com testemunha e tudo se quiserem, que, para mim, num ponto essencial de minha vida, o três foi um ingrato de um número para mim. Hoje até me faz rir a sua impropriedade em minha vida. Mas o danado bem que me fez sofrer por uns tempos, mais do que três Marias Madalenas juntas.

O fato: casei uma, duas, três vezes. Sinos retumbantes! Terceiro casamento! Finalmente o final feliz de toda uma existência. Três vivas à boa nova!

Caros amigos e caras amigas, não se iludam! Podem tirar o cavalinho da chuva. Um não, três. Cavalinhos de raça, se quiserem, daqueles que eu ia ver no Jóquei Clube de Campos, aos sábados à tarde, com papai e com Maninho. E até apostava! Nada disso! Avessa a casamento, sempre querendo o príncipe, e não sendo príncipe nada feito, coloquei toda a minha fé no número três. Agora, era pra valer. Os irmãos Grimm fizeram, lá do céu, esta historinha especialmente para mim. Só que a historinha não veio com manual de orientação para a leitura (finalmente entendo a sua importância!), onde eu pudesse aprender as recomendações de paciência, compreensão e boa vontade. Resultado: na primeira tempestade, abandono o marido. Tudo bem, amor a toda, de parte à parte, ele, apaixonado, veio me buscar, e eu voltei, quase em êxtase.

Havia, nas minhas contas, uma reserva técnica a me proteger de futuras intempéries. Não eram três as oportunidades? Ainda restavam, então, duas tentativas, duas chances. Nova chuva, nem tão forte, mas eu, ciente dos meus poderes de princesa, novamente arrumo malas e parto. E lá vem ele, o príncipe do beijo encantado (bota encantado nisso!), resgatar a Rapunzel da torre, levando-a de volta ao castelo onde viviam. Nova onde de felicidade! Só desse tempo há histórias e mais histórias do amor mais inteiro e cúmplice. Vidinha simples, cada um se bastava a si e ao outro. Apartamentinho, antes insípido, agora todo remodelado, só pelas cores de uma nova almofada aqui, algumas plantinhas ali e mais adiante, uma mudança de móveis aqui e acolá, quadros, antes inexistentes, agora delicadamente postados numa e noutra parede, em suma, tudo de antes com cara, sabor e jeito novos, um verdadeiro lar. Quem quisesse poderia percorrer todo o Vale do Loire que não encontraria nenhum castelo da região com o encanto daquele cantinho ventoso próximo à Beira- Rio.  

Mas, a vida segue e faltava uma última vez para se atingir o três. Ainda dava para brincar de “se sou a mulher da vida dele”, ele virá me buscar. Mau humor, briga de verão, feito chuva, forte e acompanhada de raios e trovões, que faço eu? Rumo para a antiga casa, novamente. Desta feita, sem deixar pedra sobre pedra.

Três partidas. Pronto, acabou. Era esperar e estaria o casal de novo às voltas com o seu amor imbatível. Depois de três vezes, cada qual haveria de se precaver um pouco mais para não ir além da medida nas horas das dificuldades. Seria só aguardar que ele viria.
Pois, quem está aí desse outro lado, lendo a minha narrativa vivida na carne e nos ossos, pode começar a rir e a caçoar da minha pretensiosa sensação de ser insubstituível. Sabem do final da história? Ao contrário das vezes anteriores, da terceira vez o príncipe tomou ares de rei –  impávido –, se esqueceu de promover o final feliz e não veio novamente beijar a bela adormecida. Como no samba, o danado pegou foi uma camisa listrada e saiu por aí...
Em resumo: ao contrário de sua mística positividade, o número três, comigo, parece não funcionar. Fui nas águas de Teresinha de Jesus, para quem o terceiro foi aquele a quem Teresa deu a mão, e comigo não funcionou. Pode? Como dizia meu inesquecível Zé Américo, lembrando Bachelard, quando a coisa se mostrar muito absoluta assim, como se um único caminho fosse possível – como era o caso da imagem acerca do poder definitivo do três – há que se acrescentar um “depende”. Nada é tão de um jeito só que não possa ser de outro. Estou aqui para comprovar a tese. O três pode se esgotar antes de ser visivelmente entoado. Às vezes o dois cresce na briga e vira um três do tamanho de um bonde, intransponível.

Ou, deixando a boa ciência de lado e retomando as leis do bom humor e da graça, que sempre me regem, cabe indagar, já que sobre ele tenho falado nos últimos tempos com insistência: terá sido Murphy, que mais uma vez atuou em minha caminhada, me emprestando a escada para eu subir no mais alto coqueiro e ficar à espreita, traiçoeiro, espiando a queda da presunçosa dama que se julgava “a mulher da vida” do ser alheio? Huuuuum, quem sabe? Afinal Murphy é homem e como bom macho deve ter sido solidário com o companheiro de gênero.


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