quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Em 9 de novembro de 2013

CONTINHO MAIS QUE RAZOÁVEL...

ENFIM, O ENTENDIMENTO!

Eu quase juro que, não fosse o safanão que ele me deu pelo braço, eu não o teria visto, cruzando comigo na calçada, eu que por ali passava totalmente absorta em meus pensamentos e mais ainda entregue à pureza daquele ar que invadia minhas narinas, tamanho o bem-estar vindo das árvores que me cobriam, só vez por outra deixando passar frestinhas do sol brilhante que, por cima de todos e de tudo, senhor de si, nos alumiava...

Pois o moço foi firme e decidido:

“- Quase não a pego. Fui à sua casa e me disseram que estava entregue à natureza... mas eu não podia mais tardar em lhe conhecer e lhe confidenciar um segredo, e familiar. Você precisa se precaver.”

Mal refeita do susto e sempre esperando pelo surgimento do filho que papai haveria de ter tido fora do casamento (mesmo passados tantos e tantos anos de sua morte, ainda tenho a estranha sensação de que aquela gargalhada gostosa deve ter deixado mais alguns frutos pedidos por aí...), em fração de segundos, imagino ter chegado a hora: olho os traços da criatura, tento ver a marca da família em seu olhar, mas não me pareceu correr sangue meu por aquelas veias a mim recém apresentadas. Pelo menos a julgar pela aparência...

“- Pois, não, amigo. Quem é você? Estou surpresa...”

“- Não, não se assuste. Vejo que cheguei meio afobado e a tirei de sua tranquilidade. É que queria chegar a tempo de preveni-la, mas, pelo que me disseram em sua casa, não deu tempo.”

“- Como?”

“- É que, mesmo você não me conhecendo, sou seu primo. Mârfi Pessanha. Prazer!...”

“- Murphy???????????? Como assim? Eme, u, erre, pê, agá, ipsilone, Murphy?”

“É, o som é igual, mas o jeito de escrever é bem diferente. Eu sou Mârfi, eme, a, acento circunflexo no a, erre, efe e i, Mârfi. É  que sou de uma banda da família que os Pessanha da cidade nunca conheceram. Sempre vivemos em Imburi de Barra, lá pelas bandas do serão do antigo município de São João da Barra. Mas, posso dizer a você que, com toda a diversidade na escrita, tenho em minha vida os mesmos sintomas que no estrangeiro, nem sei bem onde, geraram as chamadas ‘Leis de Murphy’. E soube que elas lhe são corriqueiras em sua vida.... Hoje, você sabe bem, pelo Face nada é mais privado, nem nossas derrotas.”

A esta altura eu já havia convidado o parente e já havíamos nos sentado no banquinho em baixo do pé de fícus da esquina, o mesmo onde em muitas ocasiões já estive confortavelmente lendo meu jornal. A bem da verdade, ele até que se sentou, mas, eu, podem crer, caí mesmo foi estatelada naquele pedaço de madeira, duro demais naquele instante para receber o impacto de minhas carnes trêmulas e frias, diante da surpreendente revelação.

O moço, de quem agora eu começava a perceber o quanto o sangue que lhe corria nas veias eram meus aparentados, não podia supor, nem ao longe, o significado daquele momento para mim. De repente, não mais que de repente, a explicação para tantas e tantas circunstâncias vividas, onde tudo que poderia dar errado, dava mesmo.

Fração de segundos e o pensamento correndo solto... Então , é isso? O exemplo mais recente foi o constatado ontem: para proteger os pés das lindas cadeiras vindas de Minas, elas que ficam ao deus dará, ao lado da piscina, pegando sol e chuva, quando da última tempestade, eu tratei de proteger seus pés de madeira maciça, pensando o quanto lhe poderiam afetar ficarem molhados quando de chuvas muito fortes que formavam poças a lhes deixarem mergulhados, até a estiada chegar e lhe secar os vestígios. Tratei de fazer umas capinhas de plástico bem forte e vesti cada pezinho, de baixo para cima, de modo que, mesmo se chovesse canivete, eles estivessem a salvo. Minha produtividade sempre inventa umas e outras alternativas para driblar as possíveis rasteiras que a vida porventura queira me dar. Aquela foi apenas mais uma...

Mas ontem, dia de festa em casa, som pronto para rolar, cada amigo e amiga trazendo vozes e instrumentos – violão, atabaque, sax e muita caixinha de fósforo (até um saleiro entrou na dança, perdão, na música) –, qual não foi a minha surpresa? Ao cair da tarde, naquela hora em que pessoalmente dava os últimos retoques no ambiente e que vou retirar os tais saquinhos para deixar as cadeiras livres de sua proteção tão pretensamente bem imaginada por mim, percebo que cada um deles, ao invés de cumprir o papel que eu, inteligentemente pensei para lhes proteger, qual nada!, cada um havia se transformado num depósito de água acumulada onde repousava cada pé à espera do devido apodrecimento. Tudo que eu pensara, ao contrário! Pés afogados n’água. Madeira boa prontinha para ser corroída pela destruição do elemento ameaçador. De molho na água. Parecia carne-seca em véspera de feijoada. Guardando as devidas proporções, cada pé estava para a quantidade de água do seu inusitado recipiente como Maya Gabeira para a onde gigante que a fez sucumbir, assustando-nos a todos, seus admiradores.


Final da história: Mârfi e eu, correndo pra casa, abrindo o computador para buscar no Google algum antivírus para o mal comum, enquanto ele e eu, quase sem fôlego, íamos contando, um para o outro, como numa competição totalmente sem nexo, as inúmeras aplicações da nossa lei comum,  essa mesmo que me faz ser a mais prevenida das pessoas, e, olhem que mesmo assim, nem sempre consigo me livrar das intempéries cotidianísticas (Existe tal expressão? Se não, está criada. Ou a língua não é algo vivo que muda para dar conta do que vamos vivendo pela vida afora?)

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