Sobre as festas de dezembro, com pingos do que ficou e gotas
do que virá
É quase dia de Natal. Mais dois ou três dias e um novo 24 de
dezembro fará parte de nossas vidas. Mas não tem escapatória. É chegar dezembro
e, desde o primeiro enfeite com que me deparo anunciando as festas, tropeço em
alguma pedra esquecida numa esquina qualquer de minha vida, deixo-me tomar por
alguma brasa pronta para virar fogo novamente e caio pra dentro de mim mesma,
numa quase insuportável melancolia, se é que é esse o nome. Sem contar a minha
história pessoal e a agonia que a agudização da desigualdade social ganha
nestes tempos de festa, há ainda a sanha das compras, à qual nunca me adaptei e
diante da qual me sinto um peixe fora d’água, ano após ano. Seja em que época
for, só vou ao comércio por necessidades específicas e pontuais. Fora as de Buenos
Aires, vitrines nunca me atraem. Aliás, lá naquele Porto, todo o comércio me
seduz, das farmácias aos supermercados. Ali, sim, deixo-me levar por tal
contradição, sem a ela oferecer a menor resistência, a tal ponto de só ir por
aquelas bandas quando posso gastar sem remorso.
Sou daquelas pessoas que não sabe encontrar as tais boas
oportunidades e fazer comprinhas que sirvam para presentear uns e outros, na
hora oportuna. Comprar, só o necessário, e na hora da necessidade. Os filhos
insistem em querer comprar coisas para mim e eu simplesmente me recuso. Não
preciso de nada. Shoppings me dão falta de ar. Caminhar por dentro deles é
sempre um martírio. Já não gosto de andar, ainda mais apreciando lojas... Em
tempos em que se avolumam os compradores pelas lojas da cidade, como é o caso
do tempo das “compras de Natal”, aí é que passo ao largo. Sinto-me estranha,
sem dúvida, mas é como a coisa acontece. Todos às compras, e eu mais ainda em
meu canto, onde faça ou não escuro para que eu, solitariamente, cante.
Neste dezembro de 2013, mais uma vez, me defronto com um
tempo que me anuvia os olhos. Quem olhar nos meus olhos me vê. É o Natal se
aproximar e eu me embotar, desfazendo-me em choros e amofinamentos. Nem as
escrevinhações me aliviam. Ler tampouco. O desconforto vem e fica, insistente e
tocante. Faltam pessoas e sobram saudades. Já é repetitivo e até sem graça: a
cada dezembro, resta para mim, pela vida afora, vazios e estranhamentos, diante
da intensa vontade de ficar quieta num canto. Só mesmo os amigos, teimosos a
não mais poder, para romperem o bloqueio e me recolocarem de pé.
É isto mesmo: salvam-me as amizades. E é a elas que quero
agradecer, nestes tempos de renovação de intenções e votos. No fundo de minha
esquisitice natalina, tiro leite e outros tantos líquidos das pedras para
voltar à superfície e só o consigo pela força dos amigos, à frente os dois
filhos, desde que existem em minha vida. É quando penso em como as amizades me
confortam, me acrescentam, me alegram, só aí, é que me brota um sorriso
iluminando a minha face.
Que 2014 chegue com os bons amigos, uns juntos aos outros,
cada um dando de si ao bem estar do outro, pela troca de afetos e pela entrega
recíproca de boas intenções e gestos.
Vendo reduzida a utopia libertária imaginada para um futuro
para todos, cassado pelo pragmatismo da política de hoje em dia, só me resta
contar com cada amigo e cada amiga para dar sentido aos cruzamentos e paralelas
que se avizinham, unindo-se num caminhar compartilhado.
Daí meu apelo: estejamos quanto mais pudermos juntos -
compartilhando nossa diversidade, intensificando nosso companheirismo,
recriando nossas aprendizagens! Quem sabe, assim, não possamos até reaprender formas de tecer
caminhos onde a dignidade se espalhe de maneira mais universal? E sem nos
bastarmos com a facilidade do contato virtual. Queiramo-nos, cada vez mais, uns
juntos dos outros. De pertinho mesmo, fazendo cruzar nossos olhares,
tocando-nos com nossas mãos, repartindo o nosso pão do afeto.
A gente merece! E
como dizia Carlito Maia: sem deixar que as coisas aconteçam por acidente, mas
fazendo tudo de propósito.
Boas festas! Com amigos por perto!
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