LIÇÕES PRECIOSAS E NÃO TARDIAS
(Escrito em julho de 1/8/2013)
Assim como falei há um par de dias sobre a dor pela morte das crianças da
Índia, hoje sou impelida a falar das lições de grandeza que tive ontem, quase
que aqui na esquina de casa. De Itaipu fui a Pendotiba em menos de 15 minutos
para ganhar lições que perdurarão para sempre dentro de cada um dos resíduos de
mim mesma que o mar de Atafona ainda há de tragar (se é que eu posso ter
controle sobre esse meu futuro – mais ou menos – próximo).
O simples aniversário de uma amiga, um almoço junto a seus familiares, em
sua casa, me trouxe sabores emocionais e afetivos incalculáveis. Primeiro, por
rever cada um dos daquela família que foi tão próxima da minha lá atrás, ainda
em Campos. Por rever cada rosto, abraçar e beijar cada face, sentir a parecença
de cada qual com os dali mesmo e com os distantes, ainda por aqui ou já
partidos. Beijoqueira e amante do toque direto nos que amo como sou, fui
vencida pelos dali – pelo tanto com que fui acarinhada todo o tempo. E não só
pelas palavras (o que também foi muito bom – “Ah, que bom! Su estava feliz
demais em saber que você viria!”) mas na carne mesmo, beijo no beijo, abraço no
abraço, afago no afago. Ou seja: a minha presença, eu que só recentemente vejo
um pouco menos nebulosamente que sou querida, desde antes de chegar já era
anunciada como algo bom. Que sensação deliciosa! Realmente, antes de minha
morte, eu precisava aprender a ver e a sentir o que antes, por minhas próprias
incertezas e marcas, ficavam invisíveis à minha própria percepção.
Mas isso foi apenas o começo. Muito mais havia por vir. Não que tenha sido
menor ou maior o que veio em seguida. Não! Não há quantificações. São
sentimentos e observações incomparáveis, apenas sentidas e que me põem a
registrar, a pôr pra fora, sempre por intermédio delas – das palavras –, tamanha
a força com que se movem dentro de minha alma.
Eu me refiro à chegada dos pais da minha amiga, quando eu já tinha tomado
a primeira dose de whisky, tão
especialmente a mim servida por um dos primos, em cuja fisionomia reconheci a
irmã, que não vejo há tanto tempo... Cara de gente boa, que dá vontade de
(re)conhecer melhor. Mas isso é pra depois, como já me ensinou há muitos e
muitos anos, Scarlett O’Hara em “E o vento levou”.
O momento é de falar dos pais, o lindo casal de velhinhos que chegou para
fazer vibrar a minha alma teimosamente romântica. Sei que vale pouco dizer que
chorei, já que minhas lágrimas são inteiramente desprestigiadas, meio como arroz
de festa em minha face. São tão banais que não comovem mais ninguém. Creio
ser eu mesma a única a acreditar na força e veracidade com que afloram e não se
deixam esconder. Pois o fato é que os dois amorosos seres fizeram com que
lágrimas encharcassem a minha face envelhecida. Cada qual com seus 90 anos, ela
já bastante ausente pela doença, o carinho do marido pela mulher, tentando
trazê-la todo o tempo de volta ao seu redor, eram o meu sonho de amor posto
visível, palpável, à prova, ali na minha frente. Era olhar e ver. E as filhas,
todas, em relação ao casal? Ora um docinho na boca, ora um passar de mão pela
testa, ora o cuidado em ajeitar a almofada por baixo dos pés da linda senhora.
Cada qual a seu tempo, cada qual à sua maneira, cada qual em sua forma de
amar... e ele, o marido, encantador, bebendo o seu abacaxi com sei lá qual tipo
de álcool, sem se esquecer de, todo o tempo estar inteiro, ao lado da mulher.
E tem mais, pois o que não faltou ali foi amor demonstrado em gestos e
atitudes. Falo agora do caso da menininha, uma das integrantes da novíssima
geração, a dos filhos dos filhos dos filhos. Vivendo uma situação de alergia
alimentar, mereceu por parte da dona da casa a busca por um produto que
imitasse, de algum modo, o chocolate – pela pequena tão apreciado –, mas, por
agora, proibido de ser ingerido. O produto, de que não me recordo o nome, foi
adquirido pela aniversariante numa loja especializada – ou seja, foi alvo de
trabalho, em nome do amor ao próximo (no caso, de uma proximinha de volumosos e
sedosos cabelos cacheados), procurado pelo comércio, vindo a ser o ingrediente
do bolo em torno do qual cantamos o “Parabéns pra você”.
E eu que achava que sabia amar! No meu íntimo, o que sinto mesmo é que, no
mínimo, preciso registrar essas pequenas historietas para fazer chegar a meus
filhos as lições que não pude lhes passar enquanto dava aulas no Henrique Lage ou
que redigia panfletos e ia às ruas em torno da última campanha política para
mudar o mundo.
Que bom que ainda deu tempo!
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